Capítula Dois
CLAIR DE LUNE
E
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stava de
olhos fechados deitado no colo da minha mãe enquanto meu pai fazia chocolate
quente para mim e meus irmãos. Estava frio lá fora e nos jornais nos advertiam
para não sairmos de casa, pois uma nevasca se aproximava. Mercy, Micheal, Brian
e Wilbur já estavam na cama. Eles esram os mais novinhos. Deshawn e Dominique
estavam sentados no carpete felpudo em frente a lareira jogando Monopoly quando
meu pai chegou com as canecas com chocolate quente e com o pote com
Marshmallow. Ele tinha um sorriso no rosto e eu me sentei no sofá e meu pai
entregou a minha xícara e me fez um cafuné. Meu velho me deu um sorriso e
chamou minhas irmãs para se sentarem ao meu lado. Eles ligaram a TV no canal de
música clássica e uma pianista russa tocava uma linda valsa enquanto a neve
caia lá fora.
Era só mais um dia de inverno em Denver no Colorado. Meus irmãos
dormindo no andar de cima, meus pais, minhas irmãs e eu assistindo a uma
talentosa pianista dedilhar os dedos com maestria o piano enquanto o som ecoava
pela noite. Pelo menos era assim que eu gostava de pensar que era. A realidade
era pior do que isso. Quando abri os olhos de verdade vi minhas irmãs
encolhidas no chão tentando se aquecer em uma fogueira improvisada com jornais
na lareira. Estavam sentadas no chão sujo. Mercy, Micheal, Brian e Wilbur
estavam todos dormindo em uma cama do outro lado da sala cobertos com um
cobertor improvisado e todo remendado. Para reforçar meu pai jogou sacos de
arroz que ele encontrou atrás da loja onde ele costuma ficar para encontrar os
drogados que ele vende o Cristal. Costumávamos dormir abraçados no inverno
porque se não nossos dedos acabavam congelando e doía muito fazê-los voltar a
mexer. A única parte dessa história é a TV ligada e a talentosa russa tocando o
piano. Ela tocava o terceiro movimento da Suite bergamasque chamado de Clair de
lune. Eu tinha desenhado um teclado em um pedaço de madeira que deveria ser
usado como lenha e tentava imitar os movimentos que ela fazia. Eu sempre quis
tocar piano, mas quando falei uma vez sobre isso minha mãe achou desperdício de
dinheiro e quando meu pai me trouxe um teclado de brinquedo Mercy e Brian
acabaram quebrando ele enquanto eu dormia.
Tudo o que eu tenho é o casaco do meu pai cobrindo meus ombros esse
pedaço de madeira sobre meu colo e meus dedos imitando essa linda russa que
tocava com maestria. A neve caia lá fora e meus pais tentavam se aquecer com a
chama do fogão improvisado que cozinhava a meta anfetamina. Lembro de ouvir meu
pai tossindo antes de a policia derrubar a porta e entrar de supetão assustando
a todos. Lembro de um policial me pegar nos braços tentando me acalmar.
Estiquei o braço tentando pegar o meu piano, mas o pedaço de madeira ficou para
trás enquanto meus pais foram jogados no chão e algemados. Todos meus irmãos
mais novos começaram a chorar enquanto eu tentava entender o que estava
acontecendo.
Lembro que o policial que me carregava usava galochas e a perna dele
afundava até o joelho na neve. Ele tentou por um bom tempo chegar até a viatura
para me colocar em segurança, mas teve um momento em que ele se desequilibrou e
acabou me deixando cair na neve. Nunca vou esquecer aquela sensação horrível.
Nunca senti tanto frio na vida. Fechei os olhos assustado tremendo todo e
respirei fundo sentindo meus lábios gelados. Abri os olhos devagar e percebi
que estava em um quarto com pouca iluminação. Eu estava gelado. Meus dedos
estavam doendo igual quando eu era criança.
- mas o que… - falei para mim mesmo olhando em volta. A última coisa de
que me lembro é que estar no quarto com David e de tomar a água da jarra.
Tentei mover meus braços e percebi que estava em uma banheira. Estava sem
camisa dentro de uma banheira com gelo. Estava explicado o porque de eu estar
com tanto frio. Com muita dificuldade eu consegui sair da banheira e cair de
cara o chão. Fiquei lá deitado em posição fetal tremendo de frio. Estava
assustado porque não sabia o que estava acontecendo comigo. Com certeza eu não
estava na boate porque o lugar era silencioso. Talvez até demais.
Acordar em uma banheira com gelo me lembrou da mais macabra lenda urbana
de todas: o ladrão de rins. Você acaba sendo vitima de um boa noite cinderela e
acorda no dia seguinte sem um dos rins dentro de uma banheiras com um recado:
‘ligue para a emergência, você só tem um dos rins’. Ao lembrar dessa macabra
lenda eu me virei no chão e passei as mãos nas costas e mesmo com pouca
sensibilidade percebi que não tinha nenhum corte, não estava faltando nada. Me
sentei no chão de azulejos e percebi que haviam outras banheiras ali. Me
levantei um pouco tonto e procurei pelo quarto que parecia ser de um necrotério
ou algo parecido um interruptor de luz, mas não consegui encontrar nada. Foi
quando eu lembrei do celular. Apalpei os bolsos, mas a minha carteira tinha
desaparecido.
- Merda! – falei comigo mesmo. Eu fui sequestrado e minhas coisas
sumiram. Foi nesse momento que lembrei que meu celular estava no meu tênis.
Tirei meu tênis rapidamente e arranquei a meia pegando o celular. Para minha
sorte colocaram meus pés para fora da banheira e ele estava sequinho. Tirei a
bateria e como de costume a lanterna ligou na minha cara. Usei-a para olhar em
volta e percebi que minha teoria estava certa. Parecia uma espécie de
necrotério. Havia sim outras banheiras lá dentro, mas estavam vazias a mão ser
por outra a alguns passos de mim. De longe eu pude ver que era Jack. O
traficante namorado da Sarah.
- Jack?! – falei quase cochichando – ele parecia desmaiado na banheira.
Ele estava sem camisa e ela estava jogada sob o peito dele – Jack acorda! –
falei me aproximando dele. Dei dois tapas de leve em Jack e ele parecia bem
gelado – Jack você precisa acordar – falei puxando o braço dele – a gente
precisa sair daqui Jack – falei olhando para trás vendo algumas sombras pela
porta entre aberta – olhei para Jack novamente e puxei a camisa que estava sob
seu peito e dei um pulo para trás ao ver seu peito aberto. Ele estava oco por
dentro. Nenhum dos seus órgãos internos estava lá. Com o susto deixei meu
celular cair e esbarrei em uma mesa de metal que fez com que uns instrumentos
como bisturi, fórceps, entre outros, caíssem no chão fazendo barulho.
Me abaixei rapidamente pegando o celular e olhei em volta. Vi que tinha
uma entrada de ar embaixo de uma mesa e eu rapidamente me joguei no chão e
empurrei com as duas pernas arrancando a grade. Rastejei dentro dessa tubulação
de ar no chão e coloquei novamente a grade quase sendo pego. A luz do lugar se
acendeu e eu vi dois pares de pernas entrando.
- que diabos aconteceu aqui? – falou uma voz grossa masculina.
- o garoto acordou! – falou outra voz.
- você não deu droga pra ele?
- sim, pra derrubar um elefante. Não sei o que aconteceu.
- a gente precisa encontra-lo – falou a voz do homem que parecia
ser uma espécie de mandante ou dono.
- sem problemas Cy. Ele não deve ter ido muito longe.
Eu estava certo. Precisava sair
daquele lugar. Jack estava morto e talvez Kakau também estivesse. Talvez Sarah
e David também estivessem. Comecei a rastejar de costas tentando fazer o mínimo
de barulho possível até que cheguei a dois caminhos possíveis. Segui pela minha
direita e percebi que ela me levava até o lado de fora do lugar. Seria uma
queda de uns três metros. Estava em uma espécie de mata em um lugar afastado.
Eu provavelmente me machucaria na queda e teria que correr muito e a chance
deles me pegarem era grande. A outra opção era sair pela porta da frente e pelo
o que eles conversaram só havia dois deles ali. Eu poderia enfrenta-los, mas se
eu fizesse isso às chances de acabar como Jack era grande. Eu não podia
arriscar a quebrar uma perna. Era melhor tentar sair por outro lugar. Mais uma
vez rastejei de ré e segui pelo outro lado bem devagar.
Graças a tubulação de ar eu conseguia ouvir com exatidão os passos e a
voz dos dois homens me procurando. Eu sabia exatamente onde eles estavam e
pelo oque percebi eles nem tinham pensado
na possibilidade de que eu podia estar ali debaixo do nariz deles. Essa era
minha sorte.
- que merda Cur! – falou o homem bravo – você só tem um trabalho e não
faz direito! você tinha que deixar o merdinha fugir?
- não tem problema Cy! – falou Cur – o outro rapaz nos deu muita coisa.
Talvez se a gente tirar os olhos e outras partes do garoto ele não se importe…
Decidi seguir a voz deles para ter certeza de que eram apenas dois e
depois de virar duas vezes e seguir por um corredor consegui finalmente chegar à
sala. Pelas grades consegui ver os dois homens conversando. Um deles estava de
costas para mim. O outro que parecia ser o chefe estava de frente pra mim. Ele
tinha barba espetada no rosto, era alto, magro e tinha cabeça rala, mas apesar
disso usava cabelos até os ombros. Parecia ter uns 50 ou 60 anos. O que mais me
chamou atenção é que ele parecia ser cego de um olho.
- Nem fodendo. O trabalho era dois garotos entre 20 e 30 anos e se nós
chegarmos lá com as partes de apenas 1 garoto Poppy vai retirar de você as
partes que estão faltando. Recomendo que comece a procurar esse outro filha da
puta antes que ele nos cause problemas – falou o homem olhando de um lado para
o outro.
O homem que estava de costas saiu e o chefe ficou lá parado parecendo
pensativo e pegou o celular e ligou para alguém. Nesse momento lembrei do meu
celular. Peguei meu celular e ali mesmo pensei em ligar para a emergência, mas
para meu azar não tinha sinal. A gente pensa que essas merdas só acontecem nos
filmes de terror, mas o pior é que acontece quando a gente mais precisa.
- merda de celular – falei respirando fundo. Percebi que não tinha como
sair dali. Talvez se eu ficasse até de manhã eles desistissem de mim, mas
talvez eles resolvessem procurar na tubulação de ar e então eu estaria fodido.
O cara estava ali parado e foi quando resolvi tirar uma foto dele e enviar para
todos os meus contatos do Whatsapp com uma mensagem de socorro – boa ideia Kai
– falei rindo de mim mesmo – quando tiver sinal às mensagens serão enviadas
automaticamente. Peguei o celular e criei um grupo no Whatsapp adicionando
todos os meus contatos.
‘SOS! Socorro! Fui sequestrado e esse é meu sequestrador. Enviem a
policia para essa localização. Jack James está morto’.
Enviei a mensagem no grupo junto com a localização e me aproximei o
máximo que pude da grade e ajeitei o celular para tirar a foto. Tirei o flash e
quando fui apertar o botão o homem que falava no celular mudou de posição
- merda – falei respirando fundo. Ele se virou de costas movendo a mão
como se estivesse argumentando com alguém no telefone – eu preciso esperar a
hora certa. Talvez eu só tivesse uma chance e eu não podia perder o momento
certo. Respirei fundo novamente e o cara se virou de perfil e foi virando e
virando e virando e quase ficou de frente pra mim e foi quando eu apertei o
botão tirando a foto e o celular soltou um flash mesmo eu tendo tirado. O homem
olhou na minha direção – merda!
- Ele está na tubulação de ar! Cur! Ele está na tubulação de ar e tem um
celular! – gritou o homem correndo.
- merda, merda, merda! – falou com raiva começando a engatinha de ré
dentro da tubulação. Eu precisava sair de lá de qualquer jeito. Seria a queda
de três metros ou a morte. Naquele momento não havia opções e eu sabia o que
tinha que fazer. Eu sabia que o que precisava ser feito e eu sabia que tinha a
vantagem de saber onde iria cair e o que precisava fazer. Consegui chegar em um
lugar onde consegui me virar e comecei a rastejar de frente.
- vem cá seu filha da puta! – falou uma voz dentro da tubulação, mas eu
ignorei e continuei engatinhando. Eu vi logo a minha frente a uns dois metros a
minha saída e quando cheguei a ela não pensei duas vezes e comecei a forçar com
tudo. A grade caiu lá em baixo e por um segundo eu hesitei e vi os braços do
homem rastejando logo atrás de mim. Foi então que eu me joguei lá do alto e cai
de costas no chão. Senti os galhos me cortando e uma puta falta de ar quando
atingi o chão. O meu celular caiu a uns dois metros de mim.
Mesmo com muita falta de ar eu me forcei a levantar e levantei com as
costas cheia de cortes e peguei o celular. Com um pé descalço eu comecei a
correr mata adentro sem saber onde ia parar. Os galhos cortavam meu rosto
enquanto a Clair de lune (luz do luar) era a única coisa amigável que eu tinha
no momento. Sabia que tinha mais sorte do que Jack e essa era a minha
motivação. Em um certo momento parei e olhei para trás e vi dois feixes de luz
ao longe. Eram lanternas que estavam me seguindo. Corri com mais força e com
cuidado porque com certeza tinha deslocado meu braço direito. Enquanto corria
olhei para meu celular e o filha da puta tinha desligado. Eu não tinha tempo de
tirar a bateria e recoloca-la para ligar para a polícia. Nem sei se tinha
sinal.
Depois de correr uns dez minutos sem parar eu cheguei a sentir um pouco
de gosto de sangue na boca. Eu parei de cai de joelhos no chão tentando
recuperar o meu fôlego. Estava em uma clareira e pela primeira vez pude olhar
em volta para tentar reconhecer onde estava, mas não obtive sucesso. Eu não
sabia onde estava, mas pude reconhecer a estrada logo a minha frente.
- porra! caralho! – falei me levantando e correndo até a estrada. Não
tinha carro, mas eu comecei a correr no meio da estrada. Escolhi uma direção
aleatória e comecei a correr bem rápido torcendo para que nenhum carro me
atropelasse – Socorro! – gritei alto tentando chamar a atenção de alguém que
não fossem os dois homens tentando arrancar meus órgãos. Depois de um tempo
correndo no meio da estrada eu tive um pressentimento dentro de mim. Se eu
fosse um sequestrador a primeira coisa que faria era pegar meu carro e ir pra
estrada procurar a minha vitima e com isso em mente eu corri pro outro lado da
estrada e voltei mata a dentro e cai sentado atrás de uma enorme rocha.
Foi bom sentar um pouco para poder descansar. Nesse momento eu pude
retirar a bateria do celular e recoloca-la. Quando o celular ligou percebi que
não havia sinal.
- merda – falei ouvindo barulho de carro. Nesse momento o meu instinto
era correr para o meio da rua, mas eu tive medo. Ao invés disso eu fiquei lá
parado e o carro que veio passou bem devagarinho e quem estava dentro passou
com as lanternas do lado de fora como se estivesse procurando por alguém. Eu
estava certo em parar e me esconder. O meu plano de enviar mensagem para pelo
Whatsapp tinha falhado e por isso apaguei tudo o que tinha escrito. Disquei o
número da emergência pelo meu celular e começou a chamar.
- 911, qual a sua emergência?
- alô? Eu estou em perigo! Eu fui sequestrado… dois homens mataram meu
amigo e estão tentando me matar.
- se acalme senhor. Onde você está?
- eu não sei. Eu estou escondido. Eles estão procurando por mim. Por
favor, mande ajuda. Eles estão tentando roubar meus órgãos.
- eu estarei rastreando a sua ligação e vou estar enviando uma viatura para
sua localização, por favor não saia de onde estiver e continue escondido.
- obrigado moça.
- fique na linha comigo até que a viatura chegue.
- ok, ok – falei respirando fundo.
- o senhor consegue reconhecer alguma…
- alô? – falei olhando para o celular – alô?
Meu celular tinha desligado e dessa vez não parecia ser um bug ou algo
assim. A bateria tinha acabado.
- merda, merda, merda – falei batendo a tela do celular no chão
quebrando ela por completo. Eu tentei me acalmar limpando as lágrimas dos meus olhos.
Estava nervoso e precisava ficar calmo. Fechei os olhos e comecei a orar
pedindo que tudo tivesse dado certo e que a policia não achasse que aquilo era
um trote. Orava para que eles tivessem conseguido rastrear a minha ligação.
Nunca fui de pedir nada a Deus porque nunca acreditei muito nele, mas eu não
queria morrer, não queria terminar como Jack: em uma banheira sem nada dentro.
Estava de olhos fechados pedindo a Deus que tudo desse certo quando ouvi
galhos se quebrando. Senti um arrepio na espinha naquele momento. Respirei
fundo e falei para mim mesmo que seja lá qual fosse o meu destino eu estava
preparado para ele. Ouvi vozes masculinas. Pareciam ser dois homens. Abri os
olhos assustado e comecei a chorar em silêncio enquanto eles se aproximavam.
Quando vi as árvores logo a minha frente serem iluminadas com vermelho e azul
eu soltei o ar que estava preso em meu pulmão e me levantei assustado tapando
minha visão com os olhos. Os policiais apontavam as lanternas para minha cara.
- fique parado! – falou o policial.
- não policial. Eu sou a vitima – falei com as mãos para o alto – isso
daqui é só um celular.
Quando eu disse aquilo os policiais finalmente se aproximaram de mim e
pediram por uma ambulância. Enquanto fui atendido no hospital dei o meu depoimento
e contei tudo o que sabia. Falei tudo o que tinha acontecido: sobre a festa,
sobre a droga, sexo com o professor, sobre tudo. Depois que me fizeram alguns
curativos e um médico colocou meu braço de volta no lugar eles me levaram até a
delegacia e me levaram para a sala de interrogação. Eles me deixaram lá e me
ofereceram o que comer e o que beber. Suco de uva, algumas bolachas recheadas,
pão doce e eu fiquei lá morrendo de frio naquele ar condicionado. Eu sabia que
já era de manhã porque um dos policiais me disse que era hora da troca de
expediente que era ás sete. Talvez por isso tinham me deixado ali por tanto
tempo.
Eu queria tanto poder falar com a Kakau ou com Sarah. Ela deve estar
arrasada por causa do namorado. Eu faria isso, mas eles confiscaram meu celular
quando eu disse que tinha tirado uma foto do tal de ‘Cy’. Me levantei da
cadeira para me esticar um pouco e me vi de pé para aqueles espelhos dupla face
quando a poerta se abriu de uma vez me dando um susto.
- bom dia Sr. De la Croix – falou uma mulher de cabelos pretos entrando
na sala ao lado de um outro homem.
- bom dia – falei olhando para os dois – vocês me assustaram.
- não me espanta estar assustado depois que o senhor passou – falou o
homem se aproximando e apertando minha mão.
- me chame de você ou apenas de Kai – falei apertando a mão do homem e
depois a da mulher.
- tudo bem Kai – falou o homem – eu sou o Agente Arthur Bradford e essa
é minha parceira Felicity Davenport. Nós somos do FBI – falou o homem puxando
uma cadeira para se sentar. Os dois se sentaram e eu me sentei de frente para
eles.
- FBI? – perguntei curioso.
- sim Kai – falou Felicity – você bateu de frente com a maior Quadrilha
de Tráfico de Órgãos do Mundo – falou ela colocando na minha frente uma foto
impressa que eu tinha tirado do meu celular – graças a você nós conseguimos
identificar o líder dessa quadrilha. Nós temos investigado eles por anos. Eu
peguei a foto e a olhei.
- graças a você nós finalmente vamos desmembrar a quadrilha – falou
Arthur com um sorriso.
- espera um pouquinho – falei com a foto na mão – você disse que esse
homem é o líder da quadrilha?
- sim – falou Arthur.
- acho que vocês estão enganados. Ele não é o chefe.
- como você pode saber disso? – perguntou Felicity.
- porque pouco antes de eu tirar essa foto esse cara chamado ‘Cy’…
- Cyrus Goddard – falou Arthur.
- sim – completei – esse Cyrus disse o seguinte: ‘se chegarmos lá só com
os órgãos de apenas um garoto a Poppy vai retirar os seus’.
- Poppy? – perguntou Felicity.
- sim. ele falou sobre essa Poppy. Isso significa esse Cyrus é só o
‘rosto’. A verdadeira líder da quadrilha é uma mulher.
- ele está certo – falou Arthur parecendo preocupado.
- nós não podemos prendê-lo – falou Felicity – se nós prendermos Cyrus
essa tal de Poppy com certeza tem 5 ou 6 para colocar no lugar dele e o Kai
terá um prêmio pela cabeça dele.
- o que? – falei assustado – prêmio pela minha cabeça?
- sim – falou Arthur – você disse que foi a uma festa e que sua carteira
desapareceu. Isso significa que os dois caras que te sequestraram tem sua
identidade, sabem seu nome, onde você estuda e onde você mora.
- merda – falei colocando as duas mãos na cabeça – vocês nem precisam
prendê-lo. O cara sabe que eu tirei uma foto dele porque quando eu tirei a
merda da foto saiu um flash. Ele vai vir atrás de mim de qualquer maneira.
- porque você não tirou o flash? – perguntou Arthur.
- eu tirei Agente Arthur. O problema é que a droga do meu celular tem
quase 10 anos e só funciona quando quer. Mesmo eu tendo tirado o flash ele
disparou quando eu tirei a foto.
- isso é um problema – falou Felicity – isso significa que Cyrus sabe
que a identidade dele foi comprometida. Kai não está seguro ficando aqui. Na
verdade ninguém a volta dele estará seguro se ele continuar aqui.
- eu tive uma ideia – falou Arthur pegando o celular.
- que ideia – perguntei um pouco assustado.
- eu tenho um amigo que trabalha no WITSEC – falou ele se levantando e
saindo da sala com o celular no ouvido.
- o que é WITSEC? – perguntei para Felicity.
- Programa Federal de Proteção a Testemunhas dos Estados Unidos – falou
Felicity – na verdade Arthur teve uma ótima ideia. Você vai estar mais seguro
se estiver no programa de proteção a testemunhas.
- sério? Eu vou estar nesse programa?
- não precisa ter medo Kai. Você vai receber um novo nome, receberá
abrigo, ajuda do governo, emprego, terá segurança… enfim… você fica no programa
de proteção a testemunhas e tudo o que você precisa fazer é testemunhas quando
for necessário.
- e por quanto tempo eu vou ficar?
- é difícil dizer Kai. Algumas pessoas ficam 1, 2 anos… algumas pessoas
ficam 10, 20 anos e as vezes ficam pelo resto da vida.
- eu vou poder me despedir dos meus amigos ou algo assim?
- nem pensar. Daqui você vai pra um hotel e do hotel você pega um voo,
recebe sua nova identidade, novo nome, nova história e segue sua vida.
Ouvir a Agente Felicity dizer aquilo me deixou um pouco assustado. Sentia
que era injusto não poder nem me despedir de Kakau, mas eu sabia que era para o
bem dela afinal se eu entrasse em contato com ela seria perigoso porque aquelas
pessoas e essa tal de Poppy poderiam fazer mal a ela. Talvez seja melhor para
todo mundo se eu simplesmente desaparecer. Arthur ficou por quase trinta
minutos fora da sala e enquanto isso Felicity me ofereceu algo para beber e eu aceitei.
- prefere suco ou chá?
- prefiro suco.
Ela saiu da sala e trouxe um copo e um prato com um donut.
- desculpe pelo Donut Kai, mas é o que temos para hoje – falou ela
rindo.
- tem certeza que só tem suco nesse copo – falei rindo brincando. Felicity
não deu risada e eu fiquei sem graça e tomei um gole do copo.
- eu li sua ficha Kai.
- eu pensei que meu arquivo fosse confidencial. Foi o que o juiz disse
quando eu atingi a maioridade.
- não para mim. Você passou por muita coisa. Veio de uma família de
drogados, foi separado dos seis irmãos… muita gente teria sucumbido ou se
tornado algo parecido com o que seus pais eram, mas você não.
- se tem uma coisa que eu nunca quis me tornar é meus pais.
- você nunca quis encontra-los? – perguntou ela curiosa.
- nunca – falei respirando fundo.
- consegui – falou Arthur entrando na sala e interrompendo a nossa
conversa. Ele tinha um grande dossiê em sua mão.
- o que você conseguiu? – perguntei confuso.
- eu conversei com meu amigo do programa de proteção a testemunhas e ele
disse que o processo para te incluir pode demorar até seis meses, mas eu contei
toda a sua história e disse que o nosso caso é grande e que você é uma
testemunha chave e ele estava com um caso na mão quando liguei. Ele disse que
vai te incluir no programa com um outra pessoa. Vocês tão entrar no programa
juntos – falou ele abrindo o Dossie e colocando a foto de um homem bem mais
velho do que eu. De cabelos castanhos escuros e olhos azuis.
- eu não entendi – falei pegando a foto dele – nós vamos estar no
programa juntos?
- deixa eu te explicar – falou Arthur – o programa de proteção a
testemunhas te envia pra uma cidade nova, em um estado novo, te dá uma nova
identidade, te da um emprego, moradia e tudo o que você precisa. Nesse caso você
vai entrar no programa como esse cara. Vocês vão ter uma nova vida juntos. Vocês
podem ser… sei lá… tio e sobrinho. Entendeu?
- entendi. Esse cara também está entrando no programa pelos motivos
dele?
- isso mesmo – falou Arthur – ele está há espera a mais ou menos três
meses e nesse fim de semana mesmo ele já recebe a nova identidade e começa a
nova vida. Meu plano é te incluir no mesmo programa que ele. Tudo o que você precisa
fazer é assinar esse papel e esse cara… - falou Arthur olhando a papelada – esse
tal de Cory Alphonse DeLarosa, que vai receber um novo sobrenome, será o seu
novo tio.
Felicity pegou a caneta que usava e trouxe em minha direção e eu a
peguei. Olhei para o homem da foto e respirei fundo. Eu tinha duvidas. Eu estava
surtando afinal de contas ontem estava reclamando da Iggy Azalea na minha
republica e agora estou prestes a ganhar uma nova vida.
- olha Kai… - falou Arthur respirando fundo – Felicity e eu estaremos
com você durante todo o processo. Se você não assinar você ficará confinado em
um quarto de hotel durante meses até que consigam te colocar no programa e
talvez te coloquem em algo que você não goste. Pelo menos você não estará
sozinho.
- Vamos deixa-lo pensar um pouco Arthur – falou Felicity se levantando –
leia a ficha do Cory DeLarosa e pense o quanto precisar. Tenho certeza que você
tomará a decisão certa.
- okay – falou Arthur concordando e os dois se levantaram e saíram da
sala fechando a porta e me deixando lá sozinho. Tenho certeza que eles estariam
do outro lado do espelho dupla face, mas era o suficiente para mim. Peguei a
foto do homem que seria meu ‘tio’ e o observei por alguns segundos e depois
peguei a ficha dele para tentar saber um pouco sobre ele.
Logo no inicio da ficha tinha seu nome. Cory Alphonse DeLarosa, 49 anos.
Detetive DeLarosa na verdade. Isso significa que ele provavelmente deve estar
nesse programa por causa do trabalho. Não seria tão ruim assim estar nessa com
um detetive. Seria mais seguro do que estar sozinho. Duplamente mais seguro.
Atualmente mora na capital: Washington, DC. Divorciado e tem um filho que
morreu em um acidente. Foi atropelado quando tinha 4 anos de idade. Pelo o que
li ele tem sido um solitário desde então. Assim como eu. Talvez ele não seja um
mala sem alça e a gente se dê bem. Talvez no fim das contas não seja tão ruim
assim estar nesse programa com ele. Melhor do que estar sozinho como sempre
escolhi estar desde que fui tirado dos meus pais naquela noite gelada de
inverno em Denver no Colorado.
- tudo bem – falei tocando a caneta no papel e assinando-o. Papel após
papel eu fui assinando o contrato. Quase que no mesmo instante em que fiz isso
Felicity e Arthur entraram pela porta. Isso confirma a minha teoria de que eles
estavam me observando o tempo todo.
- você está tomando a decisão certa Kai – falou Arthur com um sorriso
estendendo a mão e apertando a minha.
- espero que sim – falei respirando fundo me levantando – o que acontece
agora? Eu volto pra republica?
- boa tentativa – falou Felicity – nós vamos te levar para um hotel e
provavelmente na segunda de manhã você pega um voo para sua nova casa.
- vou conversar com meu amigo do Programa de Proteção ás Testemunhas
porque ele é quem vai confeccionar seus novos documentos com seu novo sobrenome
e seus novos dados. Seu nome continuará o mesmo, mas você terá um novo sobre
nome, os nomes do seu pai, mãe, avós maternos, paternos também serão alterados
para nomes falsos. Você sabe mais ou menos o que vai mudar né? – perguntou Arthur
enquanto pegava o dossiê de Cory DeLarosa.
- sim eu entendo – falei coçando o nariz – então tudo o que eu tenho que
fazer é esperar?
- sim – falou Felicity.
- você fez um ótimo trabalho Kai – falou Arthur com um sorriso colocando
a mão no meu ombro – você foi corajoso ao tirar uma foto daquele cara. Você esta
ajudando a salvar a vida de milhares de jovens como você e seu amigo.
- obrigado – falei sem graça – na verdade eu sou bem idiota por ter
tirado aquela foto, mas falando assim acho que faz valer a pena.
- Arthur está certo – falou Felicity, mas da próxima vez que estiver em
uma situação assim vire de costas e saia correndo especialmente se tiver um
celular que te odeie – falou Felicity rindo enquanto saiamos da sala de
interrogatório.
As paredes da minha republica pulsando não parecem ser um problema tão
grande agora. As reclamações muitas vezes parecem tão pequenas comparadas a
grandes problemas. Não podia me sentir feliz por estar a salvo quando Jack
estar morto. A verdade é que a imagem dele dentro da banheira, aberto como um
animal nunca vai sair da minha cabeça. Prometi a mim mesmo que nunca usaria
drogas que ficaria o mais longe o possível de qualquer coisa que me tornasse
algo que lembrasse maus pais e na única noite que abro mão dessa regra eu me
meto em uma grande confusão, quase perco minha vida e de certa forma eu a
perdi. Perdi minha vida e se antes meu nome era Kai De la Croix agora eu sou
apenas Kai. Não sei quem serei daqui pra frente, mas torço que pelo menos tenha
valido a pena passar por isso tudo.
Espero que tenham gostado dessa minha nova obra. Não esqueçam de deixar a opinião nos comentários (que me motiva a continuar com mais frequência) e não esqueça também de deixar o seu voto que é muito importante. Compartilhe com seus amigos que gostam de ler sobre a temática. Um grande abraço a todos e até o próximo capítulo.
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