Capítulo Trinta e Quatro
ESTE MOMENTO
K
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urt olhava para mim com seus olhos azuis
acinzentados. Estávamos longe um do outro, mas mesmo assim eu conseguia sentir
o cheiro do seu perfumo e o seu bafo que tinha cheiro de bebida e cigarro. Seu
rosto trazia sua história e eu queria olhar para ele o resto da vida. O sorriso
no rosto dele era convidativo, mas não tinha certeza se era isso que eu queria.
Fiquei em silêncio e não
respondi. Confesso que ouvir ele me pedir em namoro me deixou animado e eu
senti até uma pontada de alegria. Nunca imaginei que alguém se interessaria por
mim. Um homem nascido e criado em Detroit que passa um dia em Vermont e se
interessa por mim.
- e então? – perguntou Kurt
insistente – vai me deixar cuidar de você? Prometo que você eu não vou perder.
- eu não tenho certeza. Sabe
quando você quer algo, mas tem uma coisa dentro de você, uma voz aguda e
assustadora que te diz para não seguir a diante?
- não escute essa voz, essa voz
não está com nada – falou Kurt brincando – escute a minha voz. Ela sim vale a
pena ouvir.
- você promete que não vai me
magoar? Eu sei que estou rim agora, mas não acho que eu vá conseguir me
recuperar se outra pessoa me magoar.
- eu prometo que não vou te magoar
– falou ele pegando minha mão e levando ao peito dele – você acredita em amor a
primeira vista? – perguntou ele pra mim.
- eu nem sei se acredito em amor.
- eu me apaixonei por você desde
a primeira vez que eu te vi naquele ônibus. Quer dizer, eu ainda não sabia que
estava apaixonado por você, mas eu me apaixonei. Meu coração já sabia, mas eu
ainda não.
- o que você faria se eu dissesse
não?
- sinceramente? Eu continuaria
aqui deitado com você porque eu sei que você quer dizer sim. Eu ficarei com você
hoje, e ficaria com você um mês até que você percebesse que o certo é dizer
sim.
- sim – respondi.
- sério? – perguntou ele com um
sorriso.
- sério.
- essa é a resposta certa – falou
ele com um sorriso – agora é hora de
você cumprir sua promessa.
- qual?
- você disse que ia comer se eu
te contasse minha história.
- mas não estou com fome.
- trate de ficar - falou ele se sentando na cama – vou pegar sua
comida.
Kurt se levantou e saiu pela
porta do quarto e alguns minutos depois ele entrou ligou a luz.
- venha comer aqui na cozinha.
- eu não quero, traz a comida
aqui.
- você precisa socializar. Você
não vai ficar aqui o resto da vida. Você vai sair por bem ou vai ter que ser
carregado? Você sabe que eu tenho força o suficiente pra isso.
- tudo bem – falei me levantando.
- eu sei porque você não quer vir
– falou ele fechando a porta do quarto e vindo até mim – você está com vergonha
– falou ele colocando as duas mãos no meu ombro – você acha que as pessoas fora
desse quartão vão te julgar pelas coisas que você fez, mas elas não vão. Você
sabe quem está lá fora e sabe que eles te amam e eles não vão te julgar. Todo
mundo se machuca as vezes, todo mundo precisa liberar o que vem guardando
dentro de si.
- OK – falei respirando fundo –
eu vou tentar.
- é assim que se fala – falou
Kurt se aproximando para me dar um beijo, mas eu virei o rosto e me afastei por
impulso.
- o que foi? – perguntou ele
surpreso.
- me desculpa, é que…
- não se desculpe, eu é que peço
desculpa – vamos indo – falou ele abrindo a porta e eu sai. Jake e Amy estavam
em pé próximos a mesa.
Nós então andamos e eu me sentei
e Kurt se sentou ao meu lado. Em seguida Amy e Jake se sentaram. Nós ficamos em
silêncio e eu comecei a comer. Eu não estava mentindo quando disse que tinha
fome, mas não tinha apetite. Eu dei duas garfadas e não consegui mais comer.
Engoli na força.
- eu não quero mais.
- mas você comeu tão pouco –
falou Amy.
- come mais um pouco – falou
Jake.
- eu não estou com fome. É sério.
Se eu estivesse com fome eu comeria, mas eu realmente estou sem apetite.
- tem certeza? – perguntou Kurt.
- tenho.
- vamos ver – falou ele pegando
meu garfo e levando comida até minha boda. Eu abri a boca, mastiguei e engoli.
- tem certeza que não quer mais?
- tenho sim.
Eu realmente pensei em voltar para
a cama, mas decidi continuar lá enquanto eles comiam.
- e então Oliver… – perguntou Amy
– você decidiu ir á festa?
- que festa? – perguntou Kurt.
- todo ano aqui em Vermont eles
fazem uma festa no lago Champlain. Oliver está em um dilema. Tem dia que ele
quer ir e tem dia que ele não quer ir.
- eu não sei se quero ir.
- você tem que ir. Vai ser bom
pra você.
- você vai comigo? – perguntei
levando minha mão até o braço dele – bem que eu queria, mas eu preciso ir
embora.
- porque?
- meu trabalho.
- você trabalha de que?
- trabalho em uma corretora de
seguros. Trabalho no fim de semana uma vez por mês e por mais que eu queira
ficar é exatamente nesse fim de semana.
- então acho que não vou a essa
festa.
- olha, você precisa ir – falou
Kurt – vou ficar triste se você não for.
- eu é que vou ficar triste. Você
me pediu em namoro eu pensei que você fosse ficar aqui comigo.
- nós ainda vamos namorar. Será
um namoro a distância, mas eu te prometo que venho todos os fins de semana e
feriados te visitar e quando eu não puder vir eu pago a passagem pra você ir
até mim. nós vamos estar juntos de qualquer jeito.
- você pediu ele em namoro? –
perguntou Amy parecendo furiosa para Kurt.
- pedi sim.
- pelo amor de deus – falou Amy
se levantando – você está apenas usando ele.
- ele não está me usando.
- como você sabe Oliver? você
pensou que Tobias era legal, eu também pensei e ele te espancou. Olha o seu
rosto. Você está ferido.
- ele não está me usando, quer
dizer…
- cala a boca – falou Kurt –
quanto mais vocês tentam ajudar mais vocês pioram. Ele disse que tinha uma voz
dentro dele que dizia que tudo iria ficar pior e agora eu vejo que a voz é
exterior também.
- não manda ela calar a boca –
falou Jake.
- por favor parem de brigar –
falei calmamente – Amy eu sei que você se preocupa comigo, mas você não pode me
proteger de tudo. Eu sei que você olha pra mim e você apenas os problemas. É
assim que eu tenho me visto ultimamente. Você, Tobias, meu pai… todas as
pessoas ao meu redor tentam me mostrar que a vida pode ser melhor e que existe
sempre uma segunda chance. Vocês fazem, isso a meses e eu não acredito. Kurt
conversou comigo por trinta minutos e eu já consigo imaginar um futuro em que
não esteja preso daquele quarto. Eu sei que vocês todos gostam de mim, mas me
deixem fazer as escolhas por mim mesmo.
Parei de falar e respirei fundo.
Era difícil ter que lidar com toda essa confusão. As pessoas as vezes tentavam
me ajudar e só faziam eu me sentir pior.
- acho melhor eu ir embora –
falou Kurt se levantando – amanhã eu venho me despedir de você Oliver. Nos
vemos semana que vem.
- não vai – falei segurando o
braço dele.
- não sou bem vindo aqui.
- Amy, se Kurt for embora eu
nunca mais vou te perdoar.
- pode ficar – falou Amy mais
calma – você está certo Oliver. você está bem é que eu sei o que você passou e
fico com medo de que você piore.
- eu não vou. Pela primeira vez
sinto que vou ficar melhor. Se vocês ficar bem brigando eu vou me sentir mal de
novo.
- tudo bem, vou ficar – falou
Kurt.
- você vai ficar bem – falou Jake
segurando minha mão – eu sei tudo o que nós dois passamos. Nós vamos ficar bem
porque nós sobrevivemos ao inferno por anos. Isso que está acontecendo agora é
apenas um obstáculo pequeno comparado com o que nós dois passamos.
Eu segurei a mão de Jake e
ficamos em silêncio por um tempo. Depois que todos terminaram de jantar Kurt
ajudou Jake e Amy a limparem a mesa.
- acho que vou tomar um banho –
falei me levantando.
- você consegue sozinho? –
perguntou Kurt.
- consigo.
Me levantei e fui para o quarto.
Depois que tomei um banho demorado eu vesti uma cueca e uma bermuda bem
folgada. Gostava de ficar a vontade. Eu estava com sono apesar de ter
praticamente dormido o dia todo. Kurt tomava banho quando Jake entrou no
quarto.
- posso conversar com você?
- pode – falei vendo-o se
aproximar e sentar na cama.
- eu só quero que saiba que eu te
apoio seja lá a escolha que fizer. É claro que fazemos escolhas erradas na
vida, mas é feita de escolhas e é impossível acertar sempre. Você faz uma
escolha e ela é ruim, você faz outra escolha e ela também é ruim. O que eu
quero dizer é que você pode fazer as escolhas ruins de uma vez só e depois
ficar só com as escolhas boas. Eu acredito que Kurt seja uma boa escolha.
Aproveite o momento. Esse momento. Não fique pensando no futuro ou no passado.
Aproveite o presente.
- obrigado Jake. Significa muito
para mim que você me apoie porque no final das contas você é a única família de
verdade pra mim.
- você vai ser sempre meu irmão
mais novo – falou Jake dando um beijo no meu rosto e em seguida saindo do
quarto.
Depois que tomou um banho Kurt
saiu do banheiro sem camisa. Era a primeira vez que o via dessa forma.
- você quer que eu vista a
camisa?
- não precisa.
Kurt apagou a luz do quarto
deixando apenas a luz do abajur acesa. Em seguida ele se deitou ao meu lado.
- tinha alguém aqui no quarto
enquanto eu estava no banho?
- o Jake.
- o que ele queria?
- ele veio dizer que apoia minha
decisão.
- fico feliz que seu irmão apoie
– falou ele me abraçando por trás como na noite passada – você se importa se
dormimos desse jeito?
- não – falei fechando os olhos –
não me importo.
- boa noite – falou ele beijando
minha nuca. A barba me fez arrepiar.
- você me fez arrepiar – falei
alisando o braço dele.
- desculpa – falou ele rindo.
- sabe, meu irmão me disse uma
coisa quem e fez pensar.
- o que?
- ele disse que eu devia
aproveitar o momento. Aproveitar o dia de hoje.
- é verdade. Eu também acredito
que o agora é mais importante do que o ontem ou o amanhã.
- que bom que pensa assim porque
eu estava pensando em algo – falei me virando de bruços e olhando no rosto
dele.
- o que? – perguntou Kurt levando
sua mão até minha barriga. Eu levei minha mão até o rosto dele e alisei a barba
– acho que não vai dar certo esse namoro a distância. Você viajar para cá todo
o fim de semana e eu ficar viajando todo o fim de semana. Isso nunca vai dar
certo.
Kurt olhou para mim e eu senti
toda a alegria desaparecendo de seu rosto. aquilo me machucou muito. Muito mais
do que David, Marshall e Tobias. O olhar de Kurt me cortou o coração, mas era o
certo a se fazer.
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