VOCÊ NÃO DÁ VALOR AO QUE TEM ATÉ QUE SE VÁ capítulo dezenove
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Você não
dá valor ao que tem até que se vá’. ‘Você só vive uma vez’. ‘Você nunca sabe o
dia de amanhã’. Poderia citar dezenas dessas frases prontas que as pessoas
dizem quando não aproveitam os momentos da vida com alguém que você gosta ou
com algo que você teve não tem mais. Sempre achei que essas frases fosses
superestimadas. Frases prontas e sem sentido. Essas frases foram ditas tantas vezes
que os significados reais se perderam com o passar dos anos.
Talvez nós nunca saibamos o porque de algumas coisas acontecerem. Porque
alguém para no sinal vermelho e tem seu carro roubado? Porque alguém que nunca
reagiria a um assalto acaba levando um tiro? Algumas perguntas não tem
respostas porque talvez não exista um motivo para tudo o que acontece. As
palavras ‘aleatório’ e ‘coincidência’ existem por uma razão. Coisas ruins
acontecem com pessoas boas. Podia ter acontecido com qualquer um então porque
aconteceu com alguém que eu gosto tanto? Estava com tanta raiva dele por ter me
tratado tão mal naquela tarde que não pretendia falar com ele tão cedo. Talvez
eu tivesse dado valor ao que tinha se soubesse que iria embora tão cedo.
Estava sentado na sala de espera juntamente com Morgan, Holly, Kiff e
Eve. Nenhuma palavra havia sido dita nas últimas oito horas em que estivemos
lá. A cirurgia de Gray tinha durado toda a madrugada. O relógio marcava quase
sete horas da manhã. Ninguém se atreveu a perguntar o porque de Morgan ter dado
um tapa na minha cara e eu duvido que ela tenha contado.
- essa cirurgia está demorando demais – falei ansioso me levantando da
cadeira. Estava ficando nervoso pela demora. Passei a noite toda acordado e o
pior é que ninguém vinha dar noticiais.
- isso é normal – falou Eve ainda sentada – eles disseram que vai ficar
tudo bem. Gray disse que ficará tudo bem – falou ela tentando me acalmar – essas
cirurgias levam tempo.
- sei que vai ficar tudo bem é só que eu não tenho boas lembranças de
hospitais. Eu só espero que ele fique bem.
- você sabia Eve? – perguntou Morgan percebendo que ela sabia sobre Gray
e eu a muito tempo.
- sabia – falou Eve sem rodeios.
- é claro que sabia – falou Morgan rindo sarcástica.
Todos ficamos em silêncio e eu vi no rosto de Holly que ela estava
confusa e curiosa para saber sobre o que falávamos. Kiff tinha a mesma
expressão, mas eles não se atreveram dizer nada.
Ficamos em silêncio mais alguns minutos. Era silencioso e torturante
ficar lá sentado esperando.
- quando começou? – perguntou Morgan quebrando novamente o gelo
novamente. Ela olhava para mim.
- Morgan por favor… - falou Eve tentando encerrar o assunto que nem
tinha começado.
- Não se meta Eve – falou Morgan brava olhando para ela e depois para mim
– me responda Griffin. quando começou?
- no aeroporto… – falei olhando para Morgan – quando Gray me beijou ele
foi mais além do que devia.
- mentira – falou Morgan – aposto que foi você quem insistiu.
- olha eu não estou afim de discutir Morgan porque quando Gray estiver
bem é só você perguntar pra ele e tenho certeza de que ele vai te contar tudo.
- você é pior do que a Eve. Você fingiu todo esse tempo.
- sei que mentir foi errado, mas não me arrependo do que fiz. Me
arrependo de não ter contado antes e Gray se sente do mesmo jeito. Ele não
queria mentir pra você. Ele se senti mal e sinceramente Gray não se importava
com sua opinião porque eu devo?
- agora você é o especialista? – perguntou Morgan respirando fundo – Fui
casada com ele onze anos e você está com ele por cinco minutos e acha que sabe
os gostos dele? sabe tudo o que ele pensa?
- eu não preciso achar nada. Ele conversa comigo.
- não sei o que está acontecendo entre vocês dois, mas vai acabar. Mais
cedo ou mais tarde vai acabar.
- porque você tem tanta certeza?
- sinceramente? – perguntou Morgan – você não é o suficiente para ele.
Você é só esse projeto de ser humano todo danificado pelo passado e quando Gray
cansar de fazer caridade e bancar o ‘Papai’ ele vai cair na real e perceber que
ele tem filhos de verdade e que devia estar cuidando. É só uma crise de meia
idade.
- chega disso – falou Eve.
- e você Eve? – perguntou Morgan se levantando – você me traiu duas
vezes. Quando foi para a cama com o meu marido e agora escondendo o que sabia
sobre os dois.
- ‘ex-marido’ – falei corrigindo Morgan – você precisa aceitar que
acabou. Porque você fala tanto de Gray se você tem tanta raiva por ele ter te
traído? você é aquele tipo de pessoa que tem amor encubado Morgan porque só
fala nisso o dia inteiro e isso não é o pior. O pior de tudo é pensar que eu
realmente dei ouvido aos “conselhos” que você me deu. Olha só o que aconteceu?
Se não fosse por você talvez eu ainda tivesse o meu dinheiro e minha dignidade
porque não foi só bons materiais que Hugo levou naquela noite.
- vocês precisam se acalmar – falou Kiff – aqui é um hospital.
- você é patético – falou Morgan rindo – você realmente acha que ele vai
ficar com você? Nós ficamos juntos durante onze anos e foi ideia do Gray não
assinar os papéis de divórcio imediatamente após o divórcio e eu aceitei porque
no fundo eu sei que ele ainda me ama e por mais que ele diga que ama você o
nosso relacionamento vai ser vir primeiro do que o de vocês. Vocês estão juntos
o que? Pouco amis de um mês? Isso não supera onze anos – falou Morgan se
sentando novamente.
- você é tão esquisita que trabalha com a mulher que dormiu com o seu
marido. Sinceramente eu não sei como consegue.
Eve estava em silêncio apenas observando a briga. Ela estava sentada com
a mão na cabeça pensativa. Ela provavelmente estava imaginando como tinha se
metido nessa bagunça toda.
- é fácil – falou Morgan – pelo menos eu sei que ele transou com Eve
porque estava enjoado de mim. Isso eu posso perdoar. O mais humilhante de tudo
é saber que fui trocada por um homem. Antes ele tivesse ficado com Eve. Eu
teria conseguido viver com isso.
Quando Morgan disse isso todos pareceram ficar incomodados com o
comentário homofóbico.
- então chegamos a raiz do problema – falei me levantando – você não
está com raiva por estarmos juntos. Está com medo. Medo de não ter sido mulher
o suficiente. Você só tem medo de ter sido uma esposa tão medíocre e
insignificante que isso fez com que ele procurasse por um homem.
- vocês precisam parar – falou Holly se levantando e falando alto.
Agora percebemos que algumas pessoas prestavam atenção na briga. Percebi
também que nós falávamos muito alto.
- vocês precisam parar com esse escândalo ou vou ter que pedir que se
retirem – falou uma enfermeira.
- eles vão parar – falou Holly.
Não queria falar aquelas coisas, mas eu não iria ouvir calado. Por mais
que eu tenha errado em não contar creio que a reação seria a mesma já que o que
a está incomodando é o fato de eu ser homem.
Estávamos todos novamente em silêncio e meu celular. Tocou. Vi que era
um número desconhecido e rejeitei a chamada. Estava cansado. Fechei os olhos e
coloquei a mão na cabeça. Alguns segundos se passaram e vi que meu celular
tocou de novo. Quem me ligaria a essa hora da manhã? Decidi atender.
- alô?
- bom dia. Estou falando com Bruce Blake?
- está sim. Quem fala?
- me desculpe incomodar Bruce. Aqui quem fala é Dr. Bryan Montgomery eu
sou o advogado do seu pai.
Aquilo realmente me pegou de surpresa.
- não estou interessado em nada sobre o meu pai.
- Bruce eu preciso falar seriamente com você sobre o que vem acontecendo
com o seu pai. E usei que você recebeu
as cartas que foram enviadas.
- sim. Eu vi as cartas, eu as li e joguei fora. Me faça um favor Dr.
Montgomery não perca seu tempo vindo até aqui.
- tarde demais. Eu já estou em Los Angeles desde ontem a noite. Preciso
mesmo falar com você.
- receio que perdeu seu tempo.
- só me dê a chance de falar com você e explicar a situação. Será rápido
e eu prometo não te incomodar mais. Sei que é injusto te pedir isso levando em
consideração os motivos de seu pai estar na prisão. Sinto muito pela sua dor e
pelo o que aconteceu com seu irmão, mas eu preciso tentar. É o meu trabalho.
Serão cinco minutos e eu prometo que nunca mais te incomodo e daremos esse caso
por encerrado.
Depois de pensar um pouco decidi que era melhor falar com ele porque as
cartas continuariam a chegar e os advogado viria atrás de mim de qualquer
jeito.
- tudo bem.
- obrigado Sr. Blake. Podemos marcar um almoço para hoje?
- não. Se você quiser falar comigo terá que ser hoje e agora.
- café da manhã então.
- tudo bem. Onde está?
- estou hospedado no Paradise Gold. Tem uma cafeteria bem aqui em frente
e nós podemos comer algo enquanto conversamos.
- tudo bem, mas você tem cinco minutos porque eu estou passando por algo
no momento e o único motivo de aceitar me encontrar com você é que você
prometeu me deixar em paz.
- OK. Te vejo em alguns minutos.
Desliguei o telefone e olhei para Eve.
- o que foi? – perguntou Eve.
- eu preciso ir embora por tempo.
- aconteceu alguma coisa? – perguntou Holly.
- não é nada sério.
- o que é? – perguntou Kiff – pela sua cara não parece algo bom.
- meu pai está doente na prisão e o advogado dele quer falar comigo. Só
isso – falei me levantando – estarei de volta em menos de uma hora.
- se alguém vier dizer alguma coisa ou ele sair da cirurgia eu te ligo –
falou Eve colocando a mão no meu ombro.
Sai do hospital e peguei um taxi indo ao encontro desse advogado. Não
estava com cabeça para isso agora, mas era melhor me livrar dele agora.
Ao chegar em frente ao hotel Paradise Gold vi que tinha uma cafeteria
logo em frente. Algumas pessoas entravam e saiam e outras estavam apenas
sentadas conversando. Assim que entrei na cafeteria tentei encontrar quem era o
homem, mas ele me achou primeiro.
- Bruce? – falou uma voz masculina atrás de mim. Olhei para trás
procurando o dono da voz e vi um homem de terno.
- você deve ser Bryan – falei apertando a mão dele que estava estendida.
- sou sim, sente-se por favor Bruce – falou o homem apontando para uma
cadeira.
- prefiro que me chame de Griffin – falei me sentando.
O advogado levantou a mão e a garçonete veio nos atender.
- quer comer alguma coisa?
- só um café por gentileza – precisava de algo para me manter acordado.
A garçonete colocou café em uma xícara e eu agradeci. Tomei um gole e
coloquei a xícara de volta no pires.
- obrigado por ter concordado em se encontrar comigo – falou o advogado
colocando alguns papéis em cima da mesa.
- só um segundo – falou Bryan deixando alguns papéis caírem no chão
enquanto tirava de sua pasta. Ele parecia meio desleixado e despreparado.
- você não parece meio novo para ser advogado? – perguntei vendo ele
tentando arrumar a bagunça.
- desculpe pela bagunça – falou Bryan – respondendo sua pergunta: eu
tenho vinte e sete e sou o novo advogado designado para o caso do seu pai já
que ele não pode pagar por um – falou ele finalmente olhando para mim – não se
engane pela minha idade porque eu poderia te perguntar a mesma coisa. Você só
tem vinte e três anos e é um dos melhores contadores desse lado do país. Eu
também posso ser um ótimo advogado.
- não vamos desperdiçar o nosso tempo. O antigo advogado do meu pai
provavelmente te passou as informações do caso dele e eu não estou disposto a
lídar com isso agora. Não estou disposto a te ajudar com nada relacionado a
ele.
- você está certo. Eu estou bem atualizado quanto ao caso do seu pai só
que agora é diferente. Seu pai está doente e eles estão considerando soltá-lo
por piedade.
- isso não é justo – falei com raiva – ele foi sentenciado a prisão
perpétua. Isso significa que ele deve ficar preso até morrer. A sorte dele é
que ele está morrendo aos cinquenta. Queria que ele ficasse lá pelo menos até
os noventa anos.
- como você pode dizer uma coisa dessas do seu próprio pai?
- você está cheio de papéis ai Bryan e eu só fico pensando se por acaso
você leu a parte em que meu pai bateu tanto no meu irmão de oito anos de idade
que ele faleceu devido aos ferimentos?
- eu o conheci – falou Bryan tomando um gole da xícara de café dele –
seu pai… - ele fez uma pausa pensativo – ele fala bastante de você. Ele se
arrepende do que fez.
- que bom que ele pensa em mim porque eu não gasto meu precioso tempo
pensando nele.
- ele ficou muito orgulhoso quando eu disse que você tinha se formado em
Harvard e morava em Los Angeles – falou Bryan me mostrando uma pasta com meu
nome. Parecia ser um arquivo sobre mim – quando eu disse que você trabalha em
uma empresa de investigação particular ele até brincou dizendo que quando você
era pequeno você queria ser um detetive para pegar os caras maus.
- muito tocante sua história Dr. Montgomery, mas você sabia que meu
irmão – que a propósito se chamava Christopher – faria dezessete anos esse ano?
Ele provavelmente estaria no último ano do colegial e estaria ansioso e nervoso
por ter que ir para a universidade. Talvez ele fosse um médico e salvaria
vidas. Talvez ele se tornasse presidente dessa nação um dia ou quem sabe talvez
ele fosse apenas um mecânico… de qualquer forma eu não sei, você não sabe e meu
pai também nunca vai saber porque meu irmão não teve a chance de viver. Ele não
teve a chance de escolher porque ele não está aqui. Quando você voltar para
Nebraska pode dizer isso ao meu pai. Diga também que por causa dele eu tenho
problemas na minha vida. Dizem que nossa vida é baseada nas escolhas que
fazemos, mas como eu posso fazer escolhas saudáveis quando eu não tive alguém
que me ensinasse a escolher? Pode dizer ao meu pai que por sua causa dele eu
não me arrisco. Tenho medo das consequências. Por causa dele eu sempre escolho
o caminho mais fácil porque tenho medo de não conseguir lídar com as
dificuldades porque sei que dessa forma eu não me machuco. Por causa dele eu
acho difícil confiar. Não só em mim, mas em todos que estão à minha volta. Não
consegui confiar meu no meu próprio namorado. Um namorado que a propósito eu
não teria se dependesse dele. Eu tenho problemas em relacionamentos porque
tenho vergonha. Tenho problemas em demonstrar meu afeto por uma pessoa porque
eu não tive um bom exemplo. O que parece ser fácil para a maioria das pessoas
como um beijo em público ou fazer sexo é muito difícil porque não sei como
deixar alguém se aproximar. Nunca tive um bom exemplo na vida porque perdi a
minha mãe muito cedo e quando mais precisei de um pai o que eu tive foi um
monstro.
Bryan ficou em silêncio e não se atreveu a dizer nada.
- sabe Bryan – falei limpando meus olhos que estavam húmidos – Quando
somos crianças dizem que monstros se escondem dentro do armário ou em baixo da
cama. Acontece que o meu dormia no quarto do lado – falei me levantando – então
não se atreva vir aqui e me dizer que meu pai merece ser solto para viver os
seus últimos dias de vida porque o meu irmão tinha uma vida toda pela frente.
- eu realmente te entendo – falou Bryan – a vida foi difícil para você,
mas já parou para pensar que talvez ele foi cruel com você porque alguém o
machucou primeiro?
- isso não justifica. O meu pai também sofreu na mão do meu avô. Tanto
que eu não cheguei a conhece-los.
- Sei que não justifica – falou Bryan também se levantando – claro que
não justifica, mas você está fazendo o mesmo que ele – falou Bryan respirando
fundo – tudo o que seu pai mais precisa agora é de um filho. Não seja o monstro
dele – falou Bryan se sentando novamente.
- porque eu deveria?
- porque seu pai tem câncer – falou Bryan – tem uma outra coisa que não
está escrita nas cartas que te foram enviadas.
- o que é?
- você vai querer se sentar pra ouvir isso.
Estava relutante, mas Bryan parecia ter algo sério para falar. Já estava
lá então não tinha nada a perder. Sentei-me novamente e prestei atenção no que
ele tinha a dizer.
- seu pai tem Câncer de Estômago – falou Bryan.
- eu até imagino o porque – falei pensativo – ele sempre fumou e sempre
gostou de comida processada – falei me lembrando do meu pai no passado.
- isso não é tudo – falou Bryan pensativo – o câncer já é péssimo por si
só, mas a pouco mais de quatro meses seu pai vem desenvolvendo sintomas de
outra doença.
- qual doença?
- Alzheimer.
Aquilo foi um choque. Realmente não esperava que ele dissesse aquela
palavra. Tudo o que sei sobre o meu avô que é o pai do mau pai é que ele sofria
da mesma doença. Terminou seus dias em um asilo abandonado e sozinho porque
minha avó não aguentou a pressão de ter que cuidar de um homem doente e o único
filho que ele teve – que é o meu pai – guardava muito rancor e ódio dele. Nunca
soube exatamente o porque, mas meu pai sempre deixou claro que meu avô era um
homem mau.
- em que estágio está?
- ele não consegue guardar novas memórias e parece que muito do que
viveu ele acabou se perdendo.
- ele lembra de mim?
- sim.
- e da minha mãe?
- sim. Ele se lembra de você, da sua mãe e do seu irmão, mas ele não se
lembra do porque está preso.
- espera – falei tentando entender – meu pai não se lembra de ter matado
meu irmão?
- não – falou Bryan tentando encontrar as palavras para me explicar –
seu pai ainda acha que você tem quinze anos e que seu irmão está vivo. Ele não
se lembra de nada depois disso.
- porque ele acha que está preso?
- depende – falou Bryan.
- depende do que?
- do que nós contamos a ele. Ele geralmente acaba esquecendo o motivo de
estar preso e sempre pergunta o motivo. A maioria das vezes os guardas dizem a
verdade, mas algumas vezes eles mentem porque ele sempre chora arrependido.
- você deve estar de brincadeira – falei rindo pro dentro. Não de
felicidade, mas pela ironia. Meu pai está preso pela vida toda e nem sabe o
motivo. É como castigar um animal de estimação.
- me desculpa ter que te contar dessa forma, mas eu preciso que entenda
que a situação odo seu pai é difícil. Ele está sofrendo e na prisão eles não tem
como fornecer os cuidados que ele precisa.
- não sei que quer de mim. Talvez
meu pai não se lembre do que fez, mas eu me lembro muito bem.
- eles vão liberar seu pai as sentença de qualquer jeito. Você estando
ou não envolvido.
- então porque veio atrás de mim?
- porque eu acho que você deve visitar seu pai.
- porque eu faria isso?
- você mesmo disse que só conheceu o monstro. O monstro que matou o seu
irmão não está mais lá. Sei que pode ser errado dizer isso, mas parece que o
universo te deu um presente. A memória do seu pai se deteriorou exatamente
antes de tudo acontecer. Acho que você devia ir visitá-lo na prisão porque ele
sente saudades suas. Nem sempre ele está ligado á realidade. Algumas vezes ele
fica preso dentro da própria fantasia e revive momentos do passado. As vezes
ele acha que está em casa e diz que você foi para o colégio e de repente ele
surta e começa a gritar com os guardas e os outros detentos dizendo que o filho
foi para a escola e não voltou mais. Algumas vezes ele nem se lembra de que
teve um outro filho depois de você. Na maioria das vezes é só você e ele na
cabeça dele. nos últimos meses ele está praticamente vivendo na enfermaria da
prisão porque é mais fácil sedá-lo quando ele tem ataques de ansiedade ou então
quando acha que você desapareceu.
Aquilo tudo era novo para mim. Não sei como me sentir com tudo isso. Era
muito para que eu pudesse processar no momento.
- não sei se vou conseguir vê-lo.
- Griffin eu não preciso que testemunhe. Nesses casos eles liberam o
prisioneiro devido a doença e geralmente eles são internado em uma clínica para
pessoas com Alzheimer onde ele receberá todos os cuidados necessários e
geralmente a clínica fica a escolha do parente mais próximo, mas como nesse
caso nenhum parente próximo demonstrou interesse eles acabam internando seu pai
em um lugar qualquer. Com prisioneiros condenados a morte ou a perpétua a
situação é por porque as vezes eles os internam em hospitais psiquiátricos onde
seu pai não poderá receber visitas e viverá sempre isolado sendo constantemente
sedado e maltratado porque a sociedade não se importa com eles. Seu pai será punido
pelo resto da vida sem ao menos saber o motivo.
- se não veio aqui para que eu testemunhasse a ajude-o a sair da prisão
porque veio?
- porque eu acho que você devia pedir ao juiz que transferisse seu pai
para a Califórnia. Dessa forma você pode coloca-lo em uma clínica aqui em Los
Angeles onde você pode visita-lo.
- e porque eu ia querer ele perto de mim?
- você não entendeu oque eu
disse? Seu pai não se lembra de nada.
- desculpe, mas não estou interessado – falei me levantando para ir
embora.
- ele sabe que você é gay – falou Bryan me fazendo parar.
- o que disse?
- a parte que você contou que é gay. Algumas vezes ele se lembra.
- é só mais um motivo pra não querer ele aqui em Los Angeles perto de
mim.
- ele se arrependeu – falou Bryan olhando para mim – ele se arrepende da
reação que teve e das coisas que te disse quando você disse que é gay e algumas
vezes ele acha que você não está lá porque fugiu de casa. Então ele diz “eu
faria tudo pra ver o meu garoto de novo”.
- ele costumava me apresentar assim para os amigos – falei olhando para
Bryan – quando ele conhecia alguém novo ele dizia “esse aqui é Bruce o meu
garoto”.
- não estou pedindo que responda agora – falou Bryan também se levantando
– eu sou advogado Griffin eu sei que algumas pessoas deviam ser presas e terem
as chaves jogadas fora. A prisão foi feita para punir e reabilitar, mas o seu
pai não precisa disso. Ele não se lembra do que fez e a vida já o está punindo
o suficiente.
- quanto tempo eu tenho?
- uma semana. Se até a próxima sexta nenhum parente vivo se mostrar interessado
em cuidar do seu pai o juiz irá sentenciá-lo a um hospital psiquiátrico
qualquer do outro lado do país e você nunca mais vai ter a chance de vê-lo –
falou Bryan tirando um cartão me entregando – se você mudar de ideia é só me
ligar e eu vou dar entrada com os papéis.
- OK – falei pegando o cartão de visitas e colocando no bolso – eu te
ligo se mudar de ideia.
- obrigado pelo seu tempo – falou Bryan apertando minha mão.
A sair da cafeteria coloquei o cartão no bolso e chamei por um taxi. Nosso
encontro tinha durado quase uma hora. Precisava voltar ao hospital. Quando peguei
o telefone eu vi que ele ainda estava no silencioso desde a noite passada e
tinha três ligações perdidas de Eve.
- que droga – falei retornando para Eve que agora já não atendia. Liguei
quatro vezes no caminho até o hospital e todas as vezes chamava até ir para a
caixa mensagens.
No fim das contas desisti quando vi que estava chegando no hospital. Dentro
de mim uma batalha de sentimentos acontecia. Era como se como eu deveria me
sentir litasse com os sentimentos de como eu me sentia. Ou eu exercia o papel
de vítima ou de filho. Acho que não conseguiria conseguir balancear os dois
agora que a memória do meu pai se foi. Será que talvez ele desse valor ao que
tinha antes de ter perdido? A esposa, o filho e agora as lembranças? Outra
coisa que me preocupava agora era a doença. Meu avô teve, meu pai tem, será que
eu também terei? Será que um dia eu esquecerei quem sou e as coisas que vivi?
Depois de pagar pelo taxi entrei finalmente no hospital. Tanta coisa
passava na minha cabeça que tudo parecia em câmera lenta. Estava feliz por
finalmente ver Gray. Percebi que uma movimentação acontecia no hospital. Vi que
alguns funcionários consolavam os outros. Havia algumas enfermeiras chorando
enquanto outros tinham apenas vazios em seu olhar.
Quando finalmente cheguei a recepção vi Holly e Kiff abraçados. Morgan estava
sentada em uma das cadeiras pensativas. Aquilo era estranho. Porque todos
estavam parecendo tão tristes. Antes que pudesse abrir a boca para perguntar vi
que Eve caminhou na minha direção. Ao seu lado estava Scott. O médico e amigo
de Gray.
- e então? Ele acordou? – perguntei animado.
- Griffin… - falou Eve. Ela era a única que não estava chorando ou isolada
em um lugar qualquer do hospital.
- o que foi?
- eu sou o Dr. Scott Clarke – falou o homem apertando minha mão.
- eu sei – falei apertando a mão dele – eu sou Griffin Blake.
- acho que nós nunca fomos oficialmente apresentados – falou o médico
olhando para Eve que nos deixou a sós.
- e então… Gray está bem?
- eu sei quem é você – falou Scott.
- o que quer dizer?
- Gray é um amigo de longa data. Eu sei qual é o relacionamento de vocês
dois.
- ele te contou? – perguntou Surpreso.
- claro. Nós somos amigos a muito tempo. Somos quase como irmãos.
- ele nunca comentou isso comigo.
- engraçado porque ele falava muito de você e pelo oque ele dizia você era muito importante pra
ele.
- ‘eu sou’ – falei corrigindo.
- não entendi – falou Scott.
- desculpa te corrigir, mas é que você disse que eu ‘era’ muito
importante para Gray e na verdade eu ‘sou’ importante para ele – falei rindo
ansioso para vê-lo.
- é muito difícil ter que te dizer isso – falou Scott pausando.
- o que foi? – falei sentindo a euforia desaparecer. Percebi que tinha
algo de muito errado – eu posso ver Gray? – perguntei sentindo algo preso na garganta
– posso vê-lo?
- Pode, mas antes eu preciso te dizer uma coisa…
- o que foi? Aconteceu algo?
- nós conseguimos retirar a bala, mas infelizmente coágulos começaram a
ser formados e o que era uma simples cirurgia se tornou algo mais sério e
complicado. Nós conseguimos retirar a maioria dos coágulos, mas infelizmente um
deles chegou ao pulmão e o coração dele parou. Levou quase cinco minuto para
fazê-lo bater novamente e nesse tempo o cérebro ficou sem oxigênio. Nós fizemos
todos os testes e quase não há atividade cerebral… sinto muito.
- espera. O que está dizendo? -
perguntei sentindo um frio percorrer minha espinha – ele está morto?
- Está em coma, ligado a aparelhos.
Senti um braço passar por trás de mim e vi que era Eve. Ela me abraçou.
- você disse que ele ficaria bem – falei sentindo minha cabeça doer e
meu estômago embrulhar – Eu conversei com ele – falei gaguejando – você me
disse que ele ficaria bem, Gray disse que ficaria bem… ele me prometeu – senti
meus olhos húmidos e as lágrimas caindo.
- sinto muito Griffin – falou Scott colocando a mão em meu ombro
tentando me reconfortar.
Olhei para trás e vi que Morgan estava chorando sozinha. Kiff e Holly
também choravam e estavam abraçados. Um consolava o outro. Eve me puxou me
fazendo sentar. Olhei pata Eve e percebi que os olhos agora estava tão molhados
quanto o meu.
Meu corpo estava paralisado como se estivesse congelado, mas por dentro
eu sentia uma calor que queimava e doía demais. Porque isso aconteceu? Porque
pessoas saem um dia para correr e nunca mais voltam? Porque alguém para no
sinal vermelho e tem seu carro roubado? Porque alguém que nunca reagiria a um
assalto acaba levando um tiro? Porque pessoas como o meu pai ganham uma segunda
chance? Porque os bons sempre morrem cedo? “Você não dá valor ao que tem até que
se vá”. Essa nunca frase nunca me fez tanto sentido.
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