Capítulo 01: Me Chame Quando Você estiver Sóbrio | Conto: Paixão Secreta | Temporada: 6ª

ME CHAME QUANDO VOCÊ ESTIVER SÓBRIO capítulo um

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eus pés mal tocavam o chão. Sentia o suor escorrendo pelas minhas costas apesar da chuva. O céu amanheceu nublado e festa na noite passada não me ajudou muito. Estava atrasado e espero que eu não seja punido por isso. Porque eu fui me atrasar logo em um dia tão importante? Talvez eu descubra a resposta depois de descobrir como sair dali. Na verdade eu nem sei como cheguei. Olhei para baixo e percebi que estava no meio do jardim pisando na grama. Eu levaria uma outra bronca se alguém me visse pisando no gramado. Respirei fundo e olhei em volta procurando qual prédio eu deveria ir. A chuva estava tão forte que embasava a minha visão.  Eu já havia passado por algo parecido então eu me preveni dessa vez: a primeira coisa que comprei ao vir para cá foi uma capa de chuva. Eu sabia que chovia muito por aqui.

Naquele ponto eu era apenas um ponto amarelo correndo pelo gramado da Universidade Furman. Quatro prédios para a direita. Eu corri até que saí do gramado e cheguei ao caminho de pedras. Raios e trovões completavam o quadro do desastre. Eu odiava quando a minha fraternidade dava festar porque eu era obrigado a participar de todas elas. Pelo menos por uma hora ou duas, mas eu sempre acabava bebendo. Uma bebida atrás da outra, homens bonitos por todos os lados que eu olhava. No fim acabava sempre com o pau de alguém na boca. Geralmente um jogador enrustido que não conseguia ficar duro com a namorada procurando por um pouco de diversão. Eu estava evitando relacionamentos. E não era por falta de pretendentes.

- merda! – falei olhando para o alto. Um grande jardim com uma enorme estátua do fundados ficava logo a frente do prédio principal da universidade. Parei para observá-la por alguns segundos enquanto recuperava o fôlego. Do meu lado direito estava o Lago Furman. Havia uma grande floresta de folhas amareladas. Estávamos no outono – o que é na minha opinião – a estação mais bonita de todas. Só não imaginei que chovesse tanto. O enorme prédio com o sino da universidade que ficava do outro lado do lago parecia agora um grande borrão. Eu costumava gostar das chuvas. A muito tempo atrás. Ela só me trouxe problemas então eu decidi odiá-la, mas a verdade é que eu a amo em segredo.

Quando me inscrevi para a Universidade Furman á dois anos eu não achei que tinha alguma chance. De verdade. O motivo de escolher a Carolina do Sul é que ela fica exatamente do outro lado do país. Ficava a Três milhões, oitocentos e quinze mil e setecentos e cinquenta quilômetros de San Diego. A cidade onde vivi toda a minha vida que é também o lugar onde só tive problemas. Eu fui estuprado pelo meu pai adotivo, Larry. Descobri que era filho de um governador chamado Stephen que queria se tornar presidente. Certo tempo depois descobri que não era filho desse governador e sim de um ex-bombeiro em Nova Orleans chamado Ray. Eu me casei, separei, casei de novo e meu marido morreu. Um ano depois descobri que ele estava vivo.

Esse marido espancou um homossexual até quase matar e depois me contratou para trabalhar em sua empresa apenas para provar ao juiz que ele não era homofóbico. Eu fiz sexo com um chefe, depois com outro, depois com um médico, um outro advogado, um cowboy, um jornalista… a lista é grande e interminável e todo o homem com quem fiquei só me trouxe um bando de problemas. Viram só como minha vida é uma bagunça? Tudo isso começou com um dia de chuva quando chegava próximo a empresa onde trabalhava e um dos meus chefes idiotas jogou lama em mim. Por isso decidi deixar essa cidade. A dois anos atrás quando descobri que meu marido – agora ex – Adam Harper White estava vivo. Ele veio com um monte de desculpas. Fingiu sua morte porque estava falido e queria fugir dos cobradores. Essa é a verdadeira história. Qualquer outra coisa que ele me disse eu nunca acreditei.

 Ele achou que eu ia perdoá-lo, mas não é tão fácil. Eu o amei com todas as forças e de um dia para o outro ele simplesmente morreu. Eu passei um ano tendo pesadelos, chorando até tarde tentando dormir tentando me acostumar com a ideia de que ele não fazia mais parte da minha vida. Para que? Para que ele aparecesse do nada? E na verdade ele não apareceu foi eu quem descobriu. Passei um ano da minha vida tentando juntas os cacos da minha vida depois de sua morte e ele aparece de terno, barba, malhado e com um sorriso no rosto dizendo – oi amor, estou vivo!. Esse foi o fim para mim.

Deixei San Diego á dois anos atrás. Faz dois anos que não ouço falar de Adam. A última vez que li algo no jornal – e isso faz quase dois anos – ele tinha abrido falência de vez. Tinha ido para a reabilitação depois de dirigir bêbado e quase atropelar um grupo de adolescentes que voltavam da escola.  Ele entrou no gramado de uma Universidade em San Diego e chegou ao fundo do poço. Foi a última vez que ouvi falar dele. Na verdade foi a última vez que ouvi falar de qualquer um. Eu decidi não manter contato com ninguém. Nem com amigos, nem com nenhum dos meus três pais. Nem o adotivo, nem o falso e nem o biológico. Sentia-me bem por ter deixado aquela vida para trás. Escolhi a cidade de Greenville na Carolina do Sul porque de uns dez anos para cá ela foi a cidade que mais abriu novas empresas. Grandes e micro empresário estavam optando pela cidade de Greenville devido a grande entrada de dinheiro de investidores. Havia muitas oportunidades de emprego e em alguns meses irei precisar conseguir um emprego para me ajudar no curso. Agora eu tenho vinte e cinco anos e posso dizer que uma das poucas coisas boas que Adam me fez foi ter a inspiração para poder cursar Direito.

Não para me tornar um advogado e sim um juiz. Eu vi sujeiras demais feitas por Adam e seus parceiros. Eu não quero estar nesse lado da lei. Quero estar do lado correto. Estou vivendo na fraternidade Kappa Alpha Order. Uma fraternidade para estudantes de qualquer área que envolva Direito e Medicina. Muitas advogados e médicos famosos já fizeram parte dessa fraternidade. Johnnie Cochran – o advogado do Caso de OJ Simpson – foi o primeiro negro a conseguir entrar na fraternidade. O médico Dr. Jan Garavaglia – que examinou os falsos restos mortais de Caylee Anthony – no caso de Casey Anthony também fez parte dessa fraternidade.

A verdade é que eu nem queria ir para uma fraternidade e não vim até a Universidade Furman com essa intenção, mas eu fui convidado por um dos membros. Esse foi o primeiro passo. O segundo foi passar um teste de conhecimento, entrevistas com antigos membros da Fraternidade e a último passo era mostrar o quanto você estava comprometido com a fraternidade. Para isso fiz uma doação de duzentos mil dólares. O resto de dinheiro que me sobrava  do seguro de vida de Adam. Estava a dois meses no curso e até agora estava gostando. Não tinha muito amigos, mas certo dia acabei cruzando com Zoey Carlson em uma das festas da minha fraternidade. Ela era uma garota gótica que gostava de brincos, tatuagens e piercing. Ela estava em quase todas as festas geralmente fazendo dinheiro com algumas drogas que vendia. Ela fazia parte da irmandade Delta Gamma.

Muitos não acreditavam que Zoe fazia parte da fraternidade pelo modo que ela se vestia ou o seu linguajar que era bem cru. Mas o que muitos não sabiam é que sua mãe era Ariana Carlson. Ela é a atual porta voz da Casa Branca. O nosso atual presidente Donald Trump havia escolhido ela a dedo. Stephen Griffths – meu falso pai – não havia conseguido se eleger presidente, mas foi convidado a ser vice presidente depois que um escândalo racial acabou retirando Michael Pence de seu cargo. Zoe é meio que a ovelha negra da família Carlson. Sua mãe conseguiu que Zoe entrasse na irmandade onde ela fez parte e a fez ir para a universidade mais afastada o possível da mídia e de Washington. Acho que ela recebia uma ligação da mãe uma ou duas vezes por semana durante três minutos. A agenda da mãe era muito apertada. No fim das contas acho que Zoe nem atendia mais a ligações e a mãe dela passava algumas semanas sem ligar.

Parei de sonhar com o passado e me coloquei novamente a correr até o prédio onde eu tinha aula de Direito Processual. Atravessei o gramado cortando caminho e corri para dentro do prédio. Enquanto corria escadas acima eu retirei a capa de chuva e ao chegar no corredor eu a coloquei pendurada no primeiro cabide pelo qual eu passei. Eu respirei fundo suado e ao entrar na sala de aula eu caminhei pelas escadas. O professor estava lá embaixo explicando a matéria. Olhei de um lado para o outro procurando por um lugar vazio.  Alguns dos alunos olharam para mim de cara feia. Eu não me importava.

- com licença, com licença, obrigado – de lado eu fui me esgueirando até que ele olhou para mim. O professor parece incomodado com todo o estardalhaço que eu estava causando.

-  meu jovem, qual é o seu nome – falou o Professor Patrick Casey olhando para mim com uma expressão nada agradável. Ele parecia puto.

- Mike – falei finalmente encontrado o meu lugar e me sentando.

O professor foi até a lista de presença e procurou pelo meu nome. Ele colocou os óculos e franziu a testa enquanto o fazia.

- Mickey Fox Fabray? – ele olhou para mim.

- sim, senhor.

- porque você está atrasado para minha aula?

- por causa da chuva! Eu demorei para encontrar…

- eu não quero suas desculpas – falou ele me interrompendo – todos aqui enfrentaram os mesmos problemas e dilemas que você e todos chegaram na hora – ele se virou.

- mas a vida não é assim – falei retrucando – você está generalizando. Nem todos nós nascemos com as mesmas oportunidades. Você diria que uma criança negra abandonada na rua ou o filho de um imigrante ilegal tem os mesmos meios de uma criança branca de classe média? Se você for um defensor publico ou um juiz – como eu  pretendo ser – você não pode ver o mundo em preto e branco. Existem muitas tangentes e vertentes a serem consideradas. O Papai Trump e seus filhotes querem que todos acreditemos que sim, mas o mundo não é assim.

Toda a sala ficou em silêncio. O professor tirou os óculos do rosto e os colocou em cima da mesa pensativo. Eu esperei por uma bronca. Ele pegou novamente a folha e olhou meu nome.

- Sr. Fabray?

- sim Professor Casey – me levantei um pouco assustado.

- dizem que o segredo do sucesso é dez por cento inspiração e noventa por cento transpiração. Trabalho duro. Pelo seu discurso eu vejo que você tem a inspiração necessária, mas será que você tem os outro noventa por cento?

- quer pagar pra ver?

- quero – falou ele se virando para o quadro e escrevendo um nome – como todos vocês sabem – ou pelo menos deveriam saber – eu sou sócio da advocacia Horizon Associates. Apesar de não exercer mais a função em tribunais eu escolho todos os anos dois dos meus mais promissores alunos para trabalharem conosco. Isso pode ajudar bastante na sua grade curricular sem contar a experiência de estar em contato direto todos os dias com advogados, juízes, clientes e aprender na prática como a aplicação do que se aprende na sala de aula é feita – o professor olhou para mim – infelizmente para o restante de vocês uma das vagas já foi preenchida. Parabéns Sr. Fabray.

- obrigado professor.

- suas ideia são interessantes e sua inspiração parece não ter fim. Vamos ver como você se sai – falou ele sorrindo para mim enquanto eu me sentava em minha cadeiras.

O dia foi como qualquer outro. Pulei de uma aula a outra o dia todo. Estava exausto quando assisti a última aula que foi de Direito Constitucional. Peguei a minha capa de chuva ao sair da sala e desci as escadas saindo do prédio. O sol quase se pondo. A cena era linda. Decidi ir até a biblioteca pegar alguns livros para ler e agradeci por não estar mais chovendo.

- Mickey Fabray? – falou uma voz feminina atrás de mim. Olhei para trás e vi uma garota de pele clara e castanhos e cabelos loiros.

- sou eu – falei olhando para a garota de rosto gordinho e redondo – nós nos conhecemos?

- ainda não – falou ela esticando o braço e apertando minha mão – eu sou Alison Savanna Ferrara. Nós temos aula de Direito Processual juntos. O Professor Patrick Casey me escolheu como a segunda estagiária. Nós trabalharemos juntos.

- tudo bem – falei sem graça – prazer Alisson.

- Ally. Pode me chamar de Ally – falou ela me acompanhando.

- pode me chamar de Mike – falei sentindo uma fraca, mas gelada brisa passar por nós – você sabe quando o estágio começa?

- Daqui a duas semanas. Eu estou muito ansiosa – falou ela bem mais animada do que eu.

- eu também – falei apertando os lábios olhando para a biblioteca. Eu deveria ir até lá para encontrar Zoe. Parei e olhei para Ally.

- você é de alguma fraternidade? – pergunto Ally com a mochila de lado em apenas um dos braços.

- Sim. Kappa Alpha Order.

- sério? – falou ela impressionada.

- e você? Está em alguma irmandade?

- Sim! – falou ela animada – Kappa Kappa Kappa – ela mostrou o símbolo da sua  irmandade no bordado na blusa de frio que ela usava – a quarta da minha geração a entrar nessa universidade.

- que bom pra você.

- e você? Sua linhagem também foi da Kappa Alpha Order?

- Não. Minha mão era promotora de justiça, mas ela já faleceu e eu não sei muito sobre ela. Meu pai não cursou direito e pra ser sincero não tenho muito contato com ele… é muito complicado.

- entendo. Toda família é complicada.

- acho que já vou então. Vou encontrar uma amiga na biblioteca.

- tudo bem. Vamos trocar números para irmos conversando até o estágio começar.

- claro!

Me despedi de Ally assim que nós trocamos o número do Whatsapp. Eu caminhei rapidamente os seis metros até a biblioteca. Enquanto caminhava e olhei para o lado esquerdo. A imagem do sol refletido no lago foi quase que poético. O Lago Furman nunca esteve tão bonito. Nem quando aqueles alunos resolveram nadar pelados e foram expulsos. Em passos rápidos cheguei a biblioteca. Pendurei a minha capa de chuva no cabide e caminhei até a recepção.

- bom dia Meadow – falei cumprimentado á bibliotecária Leslie Meadow.

- bom dia Mike – respondeu ela com um largo sorriso. Ela estava sempre sorrindo. Ela lia algum livro.

- eu preciso de alguns livros de direito. Livros sobre a Constituição Americana, Leis trabalhistas.

- terceiro corredor á direita – falou ela apontando – e sua amiga gótica e vampira Zoey está sentada ali – falou ela apontando na direção das mesas – quinto corredor.

- obrigado Meadow – falei seguindo com a mochila de lado.

Procurei atentamente pelos livros e assim que os pegava eu colocava debaixo do braço. Para o meu azar o meu celular tocou. Estava alto e algumas pessoas olharam para mim. Retirei rapidamente o celular do meu bolso me desculpando com as pessoas que me encaravam. Ao olhar no visor vi o nome de meu pai Larry. Rejeitei a ligação e coloquei o celular no silêncio. Era irritante a forma que Larry ignorava o meu pedido de não ter contato com ninguém. Estava tentando reconstruir a minha vida com o que havia sobrado dela depois de tudo o que aconteceu. Faz dois anos que não o vejo e ele continua insistindo em me ligar.  

Peguei os seis livros que precisava e fui até a mesa onde Zoe estava sentada com um livro tapando o seu rosto. Parecia ser um livro sobre a Idade das Trevas. Eu me sentei ao lado dela e coloquei a pilha de livros logo na minha frente. Zoe e eu sempre nos encontrávamos na biblioteca. Não era permitido garotas na Kappa Alpha Order a menos que ela fosse para cama com algum membro. E a Delta Gamma não permitia garotos em hipótese nenhuma. Deve ser por isso que todas as membros da Delta Gamma  estavam em todas as festas que aconteciam no campus.

- o que está lendo? – falei tentando ver a capa.

- eu sei lá, só estou usando esse livro para cobrir o meu rosto. A Meadow fica olhando para mim com aquele sorriso babaca e acenando para mim – falou Zoey tirando um pouco o livro do rosto e assim que o fez Meadow deu um sorriso e acenou para Zoey.

- ela é legal – falei olhando para Zoey – e então? Você foi as aulas hoje?

- claro que não – falou Zoe fechando o livro.

- você me prometeu que ia tentar ir as aulas. Eu não julgo o seu ‘trabalho’ como traficante da universidade, mas você poderia pelo menos ir ás aulas que sua mãe está pagando.

- Eu odeio política – falou Zoe levantando o rosto de tédio – porque eu tenho que Cursar Ciências Politicas?

- fala com sua mãe.

- minha mãe não liga pra mim ou para o que eu quero. Ela só quer me manter longe o maior tempo possível. E é claro – como eu quase esqueci –Esconder do seu querido chefe Trump que a filha caçula gosta de garotas. E garotos.

- a Meadow te chamou de vampira – falei rindo – ’Gótica Vampira’.

- ótimo. Talvez ela tenha medo de vampiros e pare de ficar bancando a garota boazinha comigo. É bom que ela tenha medo que eu a morda.

- talvez ela gosta de você. Talvez ela goste de garotas. Talvez seja isso que ela quer. Que você a morda.

- Deus me libre – falou Zoe rindo – acho que ela sabe que eu vendo drogas e está tentando conseguir um pouco de maconha – falou Zoe lambendo os lábios e ajeitando os longos cabelos pretos – você quer um pouco?

- não. obrigado – falei pegando um dos livros e abrindo – eu já disse que não preciso de drogas. Eu fiz uso de uma droga uma vez – chamada Adam White – e ela acabou com a minha vida.

- engraçado como você não para de falar desse Adam mesmo odiando ele com todas as suas forças.

- Não quero falar sobre isso – falei fechando o livro para ir embora.

- estava quase esquecendo – falou Zoe pegando algo nos bolsos e jogando na minha frente – eu peguei a correspondência da semana.

- você arrombou a minha caixa de correio?

- arrombou é uma palavra que não se encaixa aqui. Ela não estava trancada.

- é porque eu nunca recebo nada, só notificações da Universidade – falei passando carta após carta até que uma me chamou a atenção. Um envelope maior do que os outros e de um papel mais grosso. Ele tinha um laço e estava escrito com uma letra dourada bem redondinha

Sr. Mickey Fox Fabray

Universidade Furman ─ Casa da Kappa Alpha Order

- o que é isso? – perguntou Zoe se inclinando um pouco para ver o que era.

- não sei, parece um convite – falei abrindo rapidamente a carta – eu fico imaginando quem mandou. Eu não contei para ninguém onde estou.

- talvez seja de um admirador secreto – falou Zoe brincando.

Abri o envelope e li ele rapidamente do começo até o fim. Pare ter certeza do que se tratava eu tive que ler novamente. Eu mal pude acreditar ao ler os nomes um abaixo do outro. O enlace do amor.

- o que é?

- um convite de casamento.

- de quem?

- de um ex namorado meu – falei olhando para Zoe e entregando o convite para ela ler.

- você vai?

- eu não.

- Será nesse fim de semana em uma ilha na Croácia.

- eu não tenho tempo dinheiro pra viajar pra croácia pra ir para um casamento. Aqui diz que o translado e a estadia será por conta dos noivos. E você pode levar um acompanhante.

- eu não sei se quero ir. Eu não quero ver ninguém do meu passado. Nem mesmo o Roman.

- se esse tal de Roman Pearce Orth – Zoe leu o nome no convite – te enviou o convite é porque você foi uma pessoa importante para a vida dele. Mike você tem que ir e precisa me levar.

- eu não sei Zoe. Acho que não. E se eu acabar encontrando alguém lá?

- você realmente acha que vai encontrar alguém do outro lado do oceano? Tá maluco? Será o fim de semana perfeito.

Peguei o convite da mão de Zoe e li novamente a carta. Era só enviar um e-mail confirmando a presença e o código para acessar as passagens de avião seriam enviados de volta. O nome do homem com quem Roman ia se casar é Rodger Maxey McGrath II. Pelo nome parece que ele tem nacionalidade irlandesa. Um monte de coisas passou pela minha cabeça ao receber aquele convite. Talvez até um pouco de raiva e ciúmes. Roman foi um dos muitos homens com quem estive e dispensei por causa dessa droga chamada Adam. Talvez fosse eu quem estivesse se casando em uma ilha na Croácia chamada ‘Mljet’.

- eu preciso ir – falei me levantando e caminhando.

- e os livros?

- eu não quero – falei caminhando pela biblioteca até chegar do lado de fora. Ouvi passos atrás de mim e tive certeza de que era Zoe.

- Mike? O que está acontecendo? Porque você saiu correndo?

- não é nada.

- é sobre o convite – falou ela segurando meu braço me fazendo parar.

- sim. é sobre o convite – falei respirando fundo para não chorar – é que essa vida era pra ser minha. Eu estou aqui no fim do mundo tentando reconstruir a minha vida patética enquanto meu ex está se casando em uma ilha paradisíaca na croácia – falei deixando as lágrimas caírem.

- vem comigo! – falou Zoe segurando no meu braço e me puxando.

- onde você está me levantado? – falei tentando puxar o braço, mas ela segurava forte.

- cala a boca e vem.

O sol estava começando a se por e Zoe me puxou pelo campus da universidade até passamos por um grande jardim e eu vi uma capela. Uma pequena igreja.

- eu não preciso ir pra igreja, eu não acredito em Deus e tenho certeza de que ele também não acredita em mim.

- cala a boca e entra – falou ela me dando um empurrão enquanto entravamos na igreja. Havia um grupo de pessoas. Sentadas. Não parecia ser uma missa, mas um encontro.

- boa noite – falou Zoe e as pessoas retribuíram. Elas pareciam conhece-la.

- boa noite – falei com um sorriso para elas que também me retribuíram. Ao caminharmos mais um pouco vi que vi que havia um lanche: Suco, café, chá, bolo e biscoitos. Zoe me puxou até a mesa juntamente com outros integrantes e ela começou a se servir.

- o que é isso? – perguntei olhando para Zoe.

- todas as quintas feiras a noite a Universidade empresta a capela para os Alcoólico Anônimos. Você disse que usou a droga chamada Adam e está chorando por lembrar do passado. Me parece que está tendo uma recaída. Precisa de uma reunião.

- sua hipócrita. você vende drogas. O que você faz aqui?

- Shhh! – falou ela pegando chá e biscoito. Eu peguei um copo para colar um pouco de suco.

- boa noite – falou alguém ao meu lado enquanto eu colocava suco em um copo.

Antes de responder olhei para o lado e vi uma mulher muito bonita com um sorriso misterioso no rosto. Sua pele era negra e seus cabelos ondulados. Ela tinha um largo sorriso.

- boa noite.

- você é novo por aqui, certo?

- sim.

- é a primeira vez dele – falou Zoe responde do por mim.

- eu sou Alexia – falou ela estendendo a mão – pode me chamar de Lexie.

- Mike – falei apertando a mão dela.

Peguei um pedaço de bolo e ao me afastar da mesa Zoe e essa nova “amiga” veio junto conosco.

- e então Mike, qual sua história? – perguntou Lexie.

- minha história?

- sim, o que fez você vir a reuniões do AA? Se não se sentir confortável para me contar não tem problema. Eu mesma só consegui contar a minha história depois da vigésima vez.

- eu não tenho uma história – falei sem graça.

- todo mundo tem uma história. Foi isso que nos trouxe aqui em primeiro lugar, certo? – falou Alexia – se não estiver confortável em me contar não tem problema. Pode demorar um pouco, mas vai acontecer – ao dizer essas palavras ela afagou meu ombro em um ato de solidariedade e em seguida olhou para a frente.

As pessoas sentavam-se uma a uma preenchendo as cadeiras. Não havia mais do que vinte pessoas.

- você não vai perguntar minha história?

- eu não quero me intrometer – falei mordendo um pedaço do bolo.

- não, tudo bem – falou ela tomando um gole do seu suco – Cocaína.

- oi? – perguntei confuso.

- Essa é minha história. Cocaína. Eu geralmente não preciso contar muito da minha história porque isso resume bastante. Não se engane. É um clichê. Tudo o que você vê nos filmes, na TV é tudo verdade. Eu destruí minha vida, perdi amigos, afastei aqueles que queriam me ajudar. Cocaína.

- sinto muito.

- não sinta – falou ela parecendo indiferente á própria história – como eu disse, é um clichê. A minha sorte é que nem todo mundo desistiu de mim – falou ela com um sorriso se levantando.

- ainda bem.

- bem Mike, quando você estiver pronto para contar sua história pode vir até mim, pode conversar com qualquer um aqui ou, se sentir que deve você pode ir lá na frente e contar para todos.

- obrigado por se importar.

- não agradeça a mim. Agradeça á Zoey que te trouxe aqui. Se ela fez isso é porque você significa muito para ela.

Olhei para Zoey e depois para Alexia que se levantou do meu lado e se colocou á nossa frente.

- boa noite – falou Alexia.

Todos responderam e nesse momento a maioria de nós ficou de pé.

- fico tão feliz por ver vocês aqui.

- Concedei-nos, Senhor, a Serenidade necessária para aceitar as coisas que não podemos modificar, coragem para modificar aquelas que podemos, e Sabedoria para distinguir umas das outras.

Depois que todos dissemos em coro a oração da serenidade nós nos sentamos. Eu estava um pouco desconfortável. Não sei porque Zoe me trouxa a essa lugar me sinto um intruso.

- eu não sei bem o motivo de todos estarmos aqui e hoje, mas eu gostaria que se sentissem livres para compartilhar se quiserem. Aqui não existe julgamentos, não existe represálias. Nesse espaço só há compreensão.

- você vende drogas. Porque você me trouxe aqui? Não é um pouco irônico?

- desde que eu comecei a vir a essas reuniões eu parei de vender drogas. Lambi os lábios e franzi a testa. Me senti surpreso por aquela revelação. Nesse momento um homem se levantou e Alexia sentou-se dando lugar a ele. O homem era alto e parecia ter mais do que um metro e oitenta. Seus cabelos eram castanhos e estavam arrepiados. Seu olhar era triste e ele deu uma boa olhada no lugar antes de suspirar.

- Olá, meu nome é Harry – falou o homem hesitante.

“Olá Harry” disseram todos juntos.

- eu não pretendia vir aqui hoje – falou Harry pensativo. Harry era um homem de olhos verdes e barba grisalha que cobria seu rosto. O bigode e as sobrancelhas eram pretos apesar dos cabelos serem totalmente brancos. Ele usava os cabelos penteados com um topete. Ele usava uma camisa de botões e pude ver que tinha tatuagens nos braços. Era um homem de talvez quarenta e cinco ou quarenta e seis anos. Ele tinha uma voz grossa e rouca. Estridente e de certa forma marcante – eu não… - falou ele parando por um momento – hoje é meu aniversário. Estou fazendo quarenta e seis anos – e assim como todos os anos eu senti um vazio dentro de mim. Eu afastei todas as pessoas de mim. Eu fazia tudo pela bebida. A bebida era tudo o que eu precisava. Eu bebia até cair, dizia coisas que não devia e quando ficava sóbrio tudo o que eu queria era beber mais e mais. Vinho barato e vodca eram os meus favoritos. Eu perdi meu emprego, perdi minha família, meus amigos, perdi minha dignidade… sei que todos aqui já se sentiram dessa forma. Todos aqui sabem a sensação que é estar chapado, estar alto. Todos aqui sabem o poder que o vicio nos dá. Aquele calor que que só sentimos quando alimentamos o vicio. Na verdade esse é o vicio. A sensação. Estou sóbrio á 1461 dias e pela primeira vez desde que fiquei sóbrio eu senti falta do calor. Falta do poder – Harry parou por alguns instantes. Todos no local ouviam avidamente o que ele tinha á dizer. Ele ficou em silêncio por alguns segundos – hoje é meu aniversário. Quarenta e seis anos. Hoje eu estou fazendo quarenta e seis anos de idade e eu estou sozinho. Não é que seja diferente do ano passado ou do ano retrasado. Desde que estou sóbrio eu tenho passado meus aniversários sozinho. No inicio eu não entendi porque me senti dessa forma. Quando acordei hoje eu estava com essa sensação com essa vontade, mas não sabia porque. Eu pensei muito o dia todo. Desde o momento em que acordei, até o momento em que sai do trabalho. Foi então que eu me lembrei – falou ele com os olhos húmidos – meu pai tinha quarenta e seis anos quando morreu. Cirrose – falou ele pensativo – é como dizem “a maçã nunca cai muito longe da árvore”. No meu aniversário de dezesseis anos de idade meu velho morreu. O que me deixa bolado não é o fato dele ter morrido, mas foi o alivio que eu senti quando minha mãe olhou nos meus olhos e disse que ele estava morto. Eu sei que minha mãe sentiu o mesmo. As marcas pelo corpo dela eram idênticas as minhas. Enfim… - falou Harry limpando os olhos – quando cheguei do trabalho eu passei em uma loja de conveniência, comprei uma garrafa de vodca. Quando cheguei em casa eu enchi um copo e em seguida sentei-me a mesa. Eu encarei o copo e minha boca ficou seca. Eu peguei o copo e aproximei-o da boca e eu senti o cheiro da bebida. Engoli em seco e por alguns segundos senti o poder que um gole me daria. Tudo o que eu queria era me sentir daquela forma novamente – ele olhou para baixo como se tivesse decepcionado – sim, eu tive uma recaída. Mil quatrocentos e sessenta e um dias jogados pelo ralo. Todo o trabalho e toda a luta que eu tive não valeram de nada. Tudo o que eu sempre quis na minha vida foi não ser como o meu pai e tudo o que eu fiz na vida foi ser como ele. Exatamente como ele, mas com uma diferença. Hoje não é o dia que eu morro. Hoje é o dia em que eu tento ficar sóbrio outra vez.

“Obrigado Harry” todos disseram junto.

O homem sentou-se novamente e nesse momento meu celular tocou. O volume estava alto e todos olharam para mim.

- desliga essa droga! – falou Zoe me dando um empurrão.

- me desculpem – falei pegado o celular. Era meu pai Larry. Percebi então que Harry e eu não éramos tão diferentes. O meu vício não me deixava em paz. Eu penso em todas as coisas que fiz para saciar meu vício. As mentiras que contei, as mentiras que eu acreditei. Sem pensar duas vezes eu desmontei o celular e em seguida me levantei jogando o chip na lixeira mais próxima. Respirei fundo e novamente juntei as partes do celular ao me sentar. Enquanto eu fazia isso eu me imaginei na frente de todos “Meu nome é Mike e eu mal comecei a ficar sóbrio”.

Zoe e eu nos despedimos de todos os membros do grupo e saímos da capela abraçados olhando a lua lá no alto. O céu estava limpo. Não havia nuvens negras nem nada.

- e então? – perguntou Zoe se afastando um passo de mim – nós vamos a esse casamento ou não?

Olhei para zoe e então fechei os olhos sentindo a brisa em meu rosto. Imaginei a chuva caindo em meu rosto como pequenos alfinetes. Tão gelada e tão densa que eu não conseguia ver nada em volta.

- sim. vamos – falei soltando uma risada.

- eu não acredito que vou pra Croácia! Haaaaaaaa! – gritou Zoe.

- também não acredito que eu vou.

Espero que tenham gostado pessoal. Eu não vou mentir, não tinha planos de fazer esse sexto livro, mas tanta gente pediu e implorou e pouco a pouco o meu amor por Mike foi renascendo. No fim das contas é um prazer poder trazer Paixão Secreta de volta a vida depois de mais de dois anos. Espero que vocês apreciem essa sexta temporada da saga de Mike. Seguindo a linha das cinco temporadas anteriores todos os capítulos tem o nome de uma música que eu uso para dar nome ao capítulo. A desse capítulo foi 'Call Me When You're Sober' do Evanescence. Espero que tenham gostado e matado um pouco a saudade. Não deixem de votar e de comentar. Um grande abraço a vocês e beijos.

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