Capítulo 16: Nem o Diabo Te Reconheceria | Conto: Deus Americano

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capítulo dezesseis

NEM O DIABO TE RECONHECERIA

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H

avia uma chuva bem fraquinha caindo lá fora. O suficiente para esfriar bastante o clima. Encarando o teto eu tentei arranjar um motivo para levantar. Era o sétimo dia. Faz sete dias que meu pai tinha sido enterrado. Meu Shivá tinha terminado. Não sei bem se a religião era algo importante para mim antes do acidente, mas decidi respeitar os sete dias em respeito ao meu pai. Ele parecia ser ligado a origem judaica. Durante esses sete dias eu não conversei com ninguém. Não tomei banho, não liguei e nem atendi telefonemas e eu mal comi. Devo ter perdido unas três quilos todos esses dias.

Em parte eu fiz isso para seguir a tradição, mas eu também não tinha apetite. Fiquei basicamente sete dias trancado no quarto. Kyara deve ter ficado feliz com isso. Ela não parecia gostar muito de mim e me ver praticamente trancado no quarto o dia todo deve ter deixado ela feliz. Ela passava muito tempo na casa de Ralf, mas era compreensível já que eles tinham um relacionamento.

Tive muito o que pensar em todos esses dias. Quando ele estava em casa – durante o dia – eu estava no quarto. Quando saia a noite para comer algo ele não estava. Ele passou as últimas noites na casa de Kyara. Aposto que tirando  o atraso de sete anos. Tive muito o que pensar em todos esses dias. O beijo de Ralf tinha mexido em algo dentro de mim. Os pais de Ralf respeitaram bastante minha dor. Durante esses sete dias só saia do quarto de madrugada pois não era permitido ver ninguém durante o luto judaico. Nada de eletrônicos também.

A dor de perder um pai é horrível. Não é natural. Nenhum filho quer viver mais os que os pais. Esse é o momento em minha vida em que eu preciso de muito apoio, mas não tive nenhum. Não que as pessoas á minha volta não se importassem, mas eu preciso de alguém como Ralf. Uma pessoa a qual eu pudesse abraçar e chorar e que apenas ficasse em silêncio, mas Ralf não faria isso. Eu não sei qual é a situação dele. Gay? Hétero? Enrustido? Ele me beijou e se afastou de mim.

Era quinta novamente. Me levantei da cama e to ei meu banho. Depois de sete dias era o que eu mais precisava. Tomei um banho demorado e vesti a melhor roupa que tinha. Passei um perfuma e destranquei a porta do quarto. O relógio marcava pouco mais das oito da manhã então imagino que todos estivessem tomando café da manhã.

Ao abrir a porta do quarto levei um susto. Caminhando  em direção ás escadas para descer eu vi um homem estranho. Não era o mesmo do meu sonho, mas eu não o reconhecia. Um homem alto, olhos azuis, cabelos loiros e barba no rosto. Era um homem alto e forte. Ao me ver sair do quarto eu deu um sorriso para mim.

- bom dia – falou o homem para mim.

- bom dia – falei achando aquilo  estranho. A voz dele era familiar. Rouca e cansada.

Esperei o homem descer as escadas e em seguida eu fiz o mesmo. Já na sal eu ouvi pessoas conversando na cozinha. Estava com vergonha depois de todos esses dias. Hesitei um pouco. Pensei e voltar para o quarto, mas não podia voltar. Tinha que seguir em frente.

Respirei fundo e caminhei em direção ao cozinha.

- bom dia – falei olhando para a mesa.

Todos responderam e olharam para mim.

- você está melhor? – perguntou uma mulher na mesa.

Meu corpo ficou paralisado. Aquilo era estranho. Haviam quatro pessoas á mesa, mas eu só reconhecia duas delas: Kyara e Randy, o pai de Ralf. À mesa havia uma mulher de cabelos ruivos e o homem de cabelos loiros que vi ao sair do quarto.

- estou sim – respondi para a estranha mulher de cabelos ruivos.

- sente-se Max – falou Randy apontando para a cadeira ao lado de Kyara.

Me sentei a mesa e fiquei calado. Todos continuaram a tomar o café da manhã em silêncio. Eu peguei um pão de queijo e dei uma mordido e olhei para Randy. Encarei ele por alguns instantes e então desviei o olhar.

- você está bem Max? – perguntou Randy.

- sim. Estou bem.

Estava intrigado. Onde diabos estava Ellen e Ralf e quem eram aqueles dois há mesa?

 Se estiver se sentindo mal pode dizer – falou o homem chamando minha atenção. Olhei fixamente para o homem e tive a impressão de que o conhecia. Seus olhos azuis me lembravam o céu e o oceano.

- me desculpa, mas… quem é você? Eu te conheço de algum lugar?

Kyara olhou para o homem ao lado dela e depois olhou para mim. Olhei para Randy e ele parecia confuso.

- Max, sou eu – falou o estranho homem apertando os lábios confuso – Sou eu. Ralf.

- você não é o Ralf – falei me levantando da mesa. Derrubei minha caneca de leite e chocolate ao fazer isso.

- você está bem? – perguntou Kyara.

- es-estou – falei gaguejando – você não é o Ralf.

- liga para a emergência – falou Ralf caminhando na minha direção.

- fica longe de mim – falei pegando a faca em cima da mesa e me afastando.

- Max! Vai ficar tudo bem – falou o homem tentando se aproximar.

- OK! Ok! – falei ofegante.

- quem é você? – falei olhando para a outra mulher á mesa.

- sou eu. Ellen.

 Minha cabeça doía um pouco. Aquela não era Ellen e aquele não era Ralf.

- vai ficar tudo bem – falou Randy também tentando em acalmar.

- me deixem em paz – falei largando a faca e correndo para fora da casa. Para a minha sorte eu estava com meu celular e minha carteira. Eu tinha planos de sair quando desci as escadas.

De fora da casa eu olhei para a rua e pensei  no que faria. Olhei para trás e vi que Randy, Kyara e os dois impostores tinham me seguido. Corri pela calçada o mais rápido que pude. Sem olhar para trás. Alguns metros correndo eu vi um taxi vindo pela rua. Eu pulei no meio da rua e comecei a balançar os braços para que ele parasse. Para minha sorte ele parou.

- você é louco? – perguntou o taxista quando entrei no carro.

- não. é que estou atrasado – falei mentindo.

- você deu sorte. Acabei de trazer um casal nessa direção.

- obrigado por ter parado.

- para onde você quer ir?

- Clínica Peaceful Healing Coast.

- chegaremos lá em instantes – falou o motorista dando meia volta.

- obrigado.

Meu coração ainda batia forte. Não sei  oque estava acontecendo, mas eu sabia que o problema não era eles e sim eu. Por mais que aquele homem não fosse Ralf eu reconhecia a voz. Era a mesma voz macia e rouca que cochichou em meu ouvido no aeroporto dizendo que “tudo iria ficar bem”. Mas porque Ralf não se parecia com… Ralf?

Tinha outros planos para o dia de hoje, mas eu precisava ver o doutor Bryan O’Connor. Talvez ele soubesse o que está acontecendo comigo. Será que estou ficando louco? Será que estou perdendo a memória de novo? Porque eu me lembrava de Kyara e Randy, mas não me lembrava de Ralf e Ellen?

Quando o taxi estacionou em frente a clinica quase vinte minutos depois eu paguei a corrida e agradeci novamente por ele ter parado para um louco pulando no meio da rua. Olhei para o celular antes de entrar na clínica e vi que não tinha nenhuma ligação. Ralf não tinha meu número. Ninguém deles tinha.

Caminhei para dentro da clínica e fui até a recepção.

- bom dia.

- muito bom dia – falou a recepcionista – qual médico você veio ver?

- Dr. Bryan O’Connor.

- você é Terrence Phillips? – perguntou a recepcionista?

- não. na verdade eu não tenho nada marcado.

- você precisa marcar um horário. Dr. Bryan não atende ninguém fora a agenda.

- eu preciso muito falar com ele. Sou paciente.

- sim, mas mesmo os pacientes precisam marca hora.

- eu posso ficar aqui na recepção para falar com ele? Por favor. Quando ele terminar com um paciente avise que estou aqui. Tenho certeza de que ele vai querer me ver.

- tudo bem, qual seu nome?

- Max Rutherford Loudorn.

- tudo bem Sr. Loudorn. Vou avisar o Dr. O’Connor que você está aqui.

- muito obrigado – falei me sentando.

Não sabia quanto tempo ficaria ali, mas eu não iria embora enquanto não conversasse com Dr. Bryan O’Connor. Durante trinta minutos eu esperei. Quando um paciente veio pelo corredor a recepcionista deixou a recepção por alguns minutos. Fechei os olhos e levei minha mão até o rosto. Respirei fundo e pedi a Deus que quando o Dr. Bryan aparecesse eu o reconhecesse. Eu não queria passar por aquilo de novo. Não queria esquecer as pessoas outra vez. Não podia passar por aquilo de novo. Não tinha forças.

- Max? – falou a voz do Dr. Bryan.

Olhei para ele e senti um frio na barriga. Ele era exatamente como me lembrava.

- olá Dr. Bryan. Desculpa ter vindo sem avisar.

- não tem problema – falou ele estendendo a mão e apertando – como você está?

- mal. Não posso mentir. Estou péssimo.

- Taisha, remarque as sessão da parte da manhã.

- sim Doutor – falou a recepcionista sorrindo.

- venha comigo – falou Dr. Bryan me caminhando até a sala dele.

Quando entrei ele fechou a porta e olhou para mim.

- sente-se Max.

- OK – falei me sentando. Estava aparentemente nervoso e ansioso.

- está um pouco ansioso? – perguntou Dr. O’Connor se sentando na poltrona á minha frente

- estou sim. Muito ansioso.

- o que foi? O que te fez vir aqui hoje?

- na verdade eu não vim antes porque eu estava de luto. Eu sou Judeu… eu acho. Já ouviu falar do Shivá?’

- sim. Sete dias preso sem contato com ninguém.

- exato. Hoje é o oitavo dia. Não sei bem se eu era o tipo de pessoa muito ligado a religião, mas eu senti que devia fazer isso pelo meu pai.

- foi isso que te trouxe aqui hoje? Seu pai?

- Não. Quem me dera fosse isso.

- o que aconteceu com você?

- Bem… como eu disse, eu fiquei sete dias sem contato com ninguém. Não vi ninguém, não conversei com ninguém. Estou hospedado na casa do soldado que me salvou no aeroporto.

- sério? – perguntou Dr. Bryan surpreso.

- sim. Eles forma legais me acolher já que minha mãe não me considera mais um filho.

- e como você tem se sentido?

- não é como eu tenho me sentido e sim como eu estou vendo as coisas.

- o que quer dizer? – perguntou Dr. Bryan curioso.

- quando sai do quarto hoje de manhã e fui tomar o café da manhã haviam quatro pessoas na mesa, mas eu não reconhecia duas delas. Quando perguntei quem elas eram elas me disseram que eu as conhecia. Era Ralf, o soldado e a mãe dele. Eu os reconhecia. Antes de entrar no quarto.

- você está falando sério? – perguntou Dr. Bryan curioso.

- sim. Eu vim correndo pra cá. Eu sabia que tinha algo a ver com minha memória. Eu estou perdendo ela de novo, não estou?

- se acalmar – falou Dr. Bryan se levantando da poltrona rindo de mim – fica calmo.

- vou tentar – falei respirando fundo.

- quando você olhou para os dois estranhos na mesa qual foi a primeira coisa que pensou? – perguntou Dr. Bryan pegando algo em um armário dentro do consultório.

- quem são esses dois? Eu fiquei confuso. Os dois estranhos me tratavam como se me conhecessem.

- você sentiu falta de alguém?

- sim. O Ralf e da mãe dele, Ellen.

- isso é bom. Significa que você não está perdendo a memória. Sua memória está em perfeito estado – falou ele voltando com uma caixa na mão.

- o que é isso?

- vou fazer um teste – falou Dr. Bryan se sentando novamente na poltrona – eu vou te mostra a foto de uma pessoa e você vai olhar fixamente para ela por oito segundos.

- tudo bem.

- em seguida vou te mostrar vários rostos e você vai tentar reconhecer qual o rosto que te mostrei.

- tudo bem – falei respirando fundo tentando me concentrar.

Br. Bryan tirou de dentro da caixa um cartão com uma foto em preto e branco de um rosto masculino.

- um, dois, três, quatro…

Ele começou a contar e eu tentava não piscar. Olhei fixamente para o rosto então Dr. Bryan guardou o cartão e em seguida se levantou

- vem aqui.

Me levantei e Dr. Bryan colocou dezesseis cartões com rostos em cima da mesa. Todos em preto e branco. Os rostos eram diferentes e estavam em outras posições. Uma passada rápida e eu apontei para o quarto rosto da segunda fileira.

- esse daqui.

- OK – falou Dr. Bryan pegando um novo cartão. Olhei fixamente e então ele embaralhou e colocou novos cartão em cima da mesa – me diga qual foi o segundo cartão que eu te mostrei.

Olhei entre os vários rostos e então apontei para o segundo cartão da quarta fileira.

- esse?

- OK – falou Dr. Bryan colocando os cartões dentro da caixa.

- só isso?

- sim – falou ele guardando a caixa de volta no armário.

- e então? O que esse teste te disse?

- bom, você acertou. Você reconheceu o rosto.

- estou confuso. O que isso te diz exatamente?

- você é um caso raro Max. Você teve amnésia que fez com que esquecesse todo o seu passado e o que você me contou são sinais de Prosopagnosia.

- o que é Prosopagnosia?

- uma doença que faz com que você não reconheça rostos. Ela geralmente se desenvolve quando se tem um trauma na cabeça, como o que você teve.

- eu não vou mais reconhecer as pessoas?

- Sim, você vai. O mais impressionante sobre isso é que você está recuperado. Uma pessoa com Prosopagnosia não teria acertado o teste. Você não teria reconhecido o rosto. Muitas pessoas tem Prosopagnosia e não sabem até que experimentam o que você experimentou hoje.

- mas e os rostos que não reconheço? Porque não reconheço Ralf e Ellen?

- infelizmente existe cura, mas felizmente você parece ter sintomas leves. Pode ser que as vezes você não reconheça algumas pessoas. Não será sempre, mas quando acontecer tente focar no que faz você lembrar dessa pessoa como trejeitos, roupas, a voz… Seu cérebro com o tempo verá a pessoa de verdade. Os rostos que você viu hoje eram falsos.

- mas como isso é possível?

- Mas Ralf está tão diferente.

- na verdade você vê o verdadeiro Ralf, mas seu cérebro não processa a imagem como deveria por isso ele parece tão diferente.

- feche os olhos – falou Dr. Bryan.

- OK – falei fechando os olhos e respirando fundo.

- quando você viu Ralf hoje de manhã você reconheceu algo nele?

- como assim?

- trejeitos como movo de andar, de conversar…

- sim. A voz. Eu reconheci na hora. Era a mesma voz.

- quero que você feche os olhos e tente se lembrar da primeira vez que olhou nos olhos de Ralf. Imagina ele conversando com você.

- OK – falei ainda de olhos fechados – foi no aeroporto.

- me descreva a cena – falou Bryan.

- eu estava deitado no chão de costas e tudo o que sentia era alguém em cima de mim. Ele estava me protegendo por causa dos terroristas. Depois que a SWAT liberou Ralf saiu de cima de mim e eu me virei. Eu encarei  o teto e vi Ralf logo acima de mim – falei de olhos fechados vendo a cena na minha frente.

- do que mais você se lembra? O que sentiu?

- no começo me senti assustado, mas quando eu olhei nos olhos de Ralf eu me senti em paz. Os olhos azuis dele me lembravam o céu. Os olhos deles pareciam as ondas do mar de se quebrando. Lembro que isso me acalmou.

- você ouviu o que acabou de dizer? – perguntou Dr. Bryan.

Abri os olhos e olhei para Dr. Bryan.

 - o que eu disse?

- você acabou de me dizer que Ralf tinha olhos castanhos, mas você disse que no aeroporto os olhos azuis dele eram azuis.

- o que isso quer dizer?

- você está confuso. Você nem ao menos sabe quem é o verdadeiro. Olhos Azuis ou olhos castanhos?

- é verdade – falei tendo uma epifania – Eu me lembro dele ter olhos azuis no aeroporto, mas de uma hora para outra ele passou a ter olhos castanhos e eu nem percebi até hoje de manhã que ele era um homem diferente.

- você não precisa ficar espantado, mas talvez esses não sejam os únicos rostos que você veja diferente. Agora e no decorrer de sua vida.

- Como posso ter certeza de qual Ralf é o verdadeiro?

- Pergunte para Alguém. Peça que alguém o descreva ou você mesmo pode pedir que Ralf se descreva.

- Doutor Bryan você não sabe como tudo isso me tranquiliza – falei respirando fundo e me levantando.

- você pode voltar aqui na segunda? – perguntou Dr. Bryan se levantando.

- claro – falei caminhando até a porta;

- eu quero te apresentar á alguém. Um amigo psiquiatra que vai ficar interessado no seu caso.

- tudo bem – falei com um sorriso no rosto. Estava feliz por ter tudo esclarecido, mas estava ansioso para voltar para a casa de Ralf para confirmar que minha memória estava bem. Não queria esquecer os rostos outra vez. Dr. Bryan abriu a porta o consultório e nós caminhamos até a recepção.

- obrigado por ter me recebido doutor.

- não foi nada – falou Dr. Bryan estendendo a mão – te vejo na segunda?

- na verdade eu não sei se vou ter condição de pagar as consultas já que meu pai faleceu. Não tenho dinheiro.

- terei o maior prazer de te atender de graça e tenho certeza de que meu amigo também vai te receber de graça.

- se for assim eu volto na segunda.

- te aguardo na segunda então  -falou Dr. Bryan tocando meu ombro.

Agradeci pela consulta e sai da clínica até a rua.

Não havia nenhum taxi a vista e eu achei a corrida muito cara. Resolvi chamar por um Uber que chegou em alguns minutos. No caminho de volta á casa dos pais de Ralf meu coração batia irregular. Sentia um frio enorme na barriga. Estava nervoso. O relógio marcava quase dez horas da manhã. Quando o Uber se aproximou da casa eu vi o carro de Ursula.

- nessa casa que tem a Cerejeira do Japão – falei apontando para a casa no lado direito da rua.

- está entregue – falou o motorista estacionando em frente a casa.

- obrigado – falei saindo do carro.

Caminhei seguindo pelo caminho de pedras que levava até a porta de entrada vagarosamente. A porta da frente se abri eu vi Ursie.

- Max? – falou ela vindo na minha direção.

- oi – falei forçando um sorriso.

- onde você estava? – perguntou ela me abraçando.

- eu precisava ficar sozinho – falei abraçando ela de volta – o que está fazendo aqui?

- Ralf me ligou quando dizendo que você saiu correndo daqui. Parecia perturbado. Eu acabei de chegar.

- eu estou bem – falei quando entramos em casa.

Ursie e eu caminhamos até a cozinha e Randy e Ellen estavam sentado a mesa. Ellen era a mulher estranha. Seu rosto estava diferente do que eu conhecia, mas era provavelmente verdadeiro.

- Max? – falou Randy se levantando – você está bem filho? – perguntou Randy tocando meu braço como se fosse meu pai. Ele estava realmente preocupado.

- estou sim. Eu só tive um surto. Acho que estava com saudades do meu pai, só isso… Estou bem agora – Falei tentando encerrar aquele assunto.

- que bom, você me deixou preocupado – falou ele apertando meu braço – bom saber que está melhor.

- também fiquei muito preocupada – falou Ellen vindo até mim e me dando um abraço – as vezes todo mundo precisa surtar de vez em quando  - falou ela com um sorriso.

- pois é – falei sem graça – não se preocupe. Estou bem. De verdade! – falei olhando em volta – onde está Kyara?

- ela foi para casa. Ela disse que tem um amigo que trabalha na policia. Ela ia pedir pra ele te procurar.

- Ralf foi com ela?

- não. Ralf está lá em cima. Ele está no seu quarto. Disse que ia procurar nas suas coisas para saber se encontrava alguma pista do porque você ter surtado.

- vou lá avisar que estou bem – falei olhando para Ursie – vem comigo.

- OK – falou Ursie me seguindo.

Nós subimos as escadas e quando chegamos lá no alto eu vi a porta do meu quarto aberta. Ralf estava lá dentro.

- você está dizendo a verdade? – perguntou Ursie segurando no meu braço – você está bem?

- a verdade eu não sei. Preciso que você me ajude com algo.

- com o que?

- você vai ver – falei caminhando até o quarto.

Em passos leves eu caminhei até o quarto. Ao chegar na porta eu vi Ralf de costas sentado na cama. Ele parecia pensativo. Talvez ele só estivesse frustrado. Minhas coisas estava jogadas em cima da cama. Ele estava chateado por não ter encontrado nada.

- toc toc – falei batendo na porta.

- olha só quem voltou – falou Ursula ao meu lado.

Ralf olhou para trás e se levantou em um pulo.

- Max! – falou ele vindo até mim. Não sabia se o Ralf que eu via era o real. Ele veio até mim e me abraçou – você está bem?

- estou sim – falei abraçando-o.

- o que aconteceu com você? – perguntou ele me soltando me olhando fixamente.

- é um problema de memória. Não reconheci você quando te vi. Nem você e nem sua mãe. Eu surtei e fui ao psicólogo. Ele disse que devido ao meu acidente eu desenvolvi uma condição a qual não me deixava reconhecer rostos.

- então quando você me viu na mesa hoje mais cedo você não me reconheceu?

- não. Você era um estranho pra mim.

- e agora?

- Não sei. Eu estou te vendo, mas será que é real? O médico disse que essa condição não tem cura, mas estou recuperado. Ele disse que as chances de eu recuperar a memória são boas, mas só tem um jeito de ter certeza.

- qual é? – perguntou Ralf ansioso.

- Ursula vai te descrever. Se o que ela descrever for o que estiver vendo é porque eu estou curado. Se o que ela descrever for diferente significa que eu estou piorando. Significa que o acidente não arruinou só meu passado, mas em breve eu vou parar de gravar novas lembranças. Eu vou esquecer de tudo com o tempo.

- OK – falou Ralf dando dois passos para trás. Ele parecia aflito e o olhar dele era triste como se ele estivesse com medo do resultado. Ele tinha medo do resultado.

- você está com medo de que eu te esqueça?

- só um pouco – falou Ralf.

- e então Ursula? Como é Ralf?

Ursula olhou para Ralf e depois olhou para mim. Ela abriu a boca, mas não conseguiu dizer. Ela hesitou e fechou a boca.

- vai Ursula. Diz logo – falei nervoso.

- não consigo. Não consigo.

- diga você – falou Ralf – o que você vê?

- Hoje cedo você era diferente. Tinha olhos azuis e era loiro. Suas feição era bem diferente. Tinha um nariz maior e uma boca menor. Agora eu te vejo da forma que me lembrava. Olhos castanhos, feições fortes e uma barba cerrada no rosto. Tem Cabelos castanhos bem penteados em um topete. Seu rosto com certeza releva que você passou por muita coisa na vida e na guerra.

- É isso – falou Ralf decepcionado – Não importa o modo que você me viu hoje de manhã… Sou exatamente o homem que você descreveu – falou Ralf com um sorriso vindo até mim e me abraçando. Ele me pegou em seus braços e me levantou. Ele tirou meus pés do chão. Ele tinha um sorriso largo no rosto. A primeira vez que eu vi ele tão feliz com algo. Não esperava que ele me abraçasse tão forte. Senti os músculos dele pressionando em mim quando ele me colocou de volta no chão.

- você é forte – falei sem graça.

- desculpa – falou ele dando um passo para trás. Só fiquei feliz por você estar melhorando. Você passou por muita coisa. Merece um pouco de paz.

- mereço sim – falei dando um passo na direção de Ralf. Eu o abracei. Deitei minha cabeça em seu ombro e o abracei. Não sabia qual seria a reação dele, mas eu o abracei. Ralf levou suas mãos até mim e me abraçou. Ele me manteve junto a ele por alguns instantes.

-  desculpa ter machucado seu pescoço – falou Ralf subindo as mãos pela minha cintura até que chegou ao meu rosto. Ele segurou entre suas mãos.

- não tem problema. É passado – falei sentindo a respiração dele no meu nariz.

Ralf aproximou o rosto do meu e deu um selinho na minha boca. Ele tocou seus lábios nos meus e eu o pressionei mais perto de mim. Me lembrei do beijo que ele me deu depois do ataque. A cerrada dele me fez cócegas. Deslizei minhas mãos pelas costas de Ralf até que cheguei em seu peito. Forte e duro. u senti um arrepio quando senti a língua dele timidamente entrando em minha boca.

- Ralf? Onde você está?– falou Kyara subindo as escadas.

Ralf me empurrou e se afastou rapidamente. Vi que ele limpou o rosto com a mão tentando limpar os vestígios  do beijo. Ele olhou para mim assustado e deu um sorriso para Kyara quando ela apareceu na porta do quarto.

- estou aqui amor – falou ele com um sorriso.

- Max?

- oi Kyara – falei sem graça.

- você apareceu?

- estou aqui – falei forçando um sorriso.

- Está tudo bem com você?

- sim. Estava um pouco abalado pela morte do meu pai sabe… muita coisa aconteceu.

- sinto muito por seu pai – falou Kyara indo até Ralf e abraçando-o. Ralf abraçou Kyara e beijou os cabelos dela e acariciou o braço dela – tudo vai melhorar com o tempo. Você vai ver.

- concordo – falou Ralf apertando Kyara para mais perto dele. Ele deu um beijo no rosto dela. Ele olhava fixamente para mim. Pela primeira vez eu senti uma pontada de ciúmes. Ao mesmo tempo eu senti um pouco de raiva. Porque Ralf fazia aquilo? Em um momento ele me beijava e no outro ele me empurrava para longe com medo de ser pego. Era difícil decifrar o que se passava na mente daquele misterioso soldado.