PARANOICO
capítulo vinte e dois
P
|
recisei
me lembrar outra vez do que aconteceu naquela noite. Tentar lembrar de cada
detalhe é o pior de tudo porque tantas vezes desejei esquecê-los. Por mais que
eu tente eu nunca vou conseguir dizer exatamente o que disse á Gray seis anos
atrás. Não ouve um dia sequer que eu não pensasse no que tínhamos feito naquele
dia. Naquele dia eu percebi que aquele eram os meus verdadeiros amigos. Todos
fazemos coisas erradas das quais nos orgulhamos, coisas das quais nos
arrependemos. Não. Eu não me orgulho do que fiz, mas também não sinto nenhum
pingo de arrependimento.
Tudo aconteceu no Baile, duas semanas
antes da formatura. O baile foi em um sábado e na época eu tinha apenas
dezessete anos. Estávamos em Abril de 2015 e esse era o momento de nossas
vidas. Parece bobeira agora que somos adultos, mas quando somos jovens só
pensamos que a vida termina no colégio, mas ela apenas começa.
Sei que posso demonstrar ser um homem
independente que sabe o que quer e não é nenhum pouco tímido, mas no colegial
eu era uma pessoa diferente. Um garoto tímido, cheio de inseguranças e medos. E
claro, era implicado no colégio pelos alunos populares como os jogadores de
futebol, líderes de torcida e até os alunos mais inteligentes do que eu que
faziam parte do clube de Decatlo Acadêmico.
Denny e Sophie eram meus únicos amigos
no colegial. Denny foi meu amigo desde que me conheço por gente. Ele falou
comigo no primeiro dia de aula. Ele era nada mais do que um aluno comum. Já
Sophie era uma garota rica, patricinha e fazia parte do grupo de teatro do
colégio. Nós nos tornamos amigos nos últimos dois anos quando na época eu fiz
um teste para o musical da escola para “Shrek”. Desde então nos tornamos amigos
e claro que ela se tornou amiga de Denny também.
Juro que se naquela época me dissessem
que eu teria me casado aos vinte e dois anos com um advogado rico eu teria dado
risada, mas o mundo dá voltas e nunca sabemos o que está logo na esquina de
nossa vida.
A maioria dos alunos não importavam com
toda essa coisa de gays, lésbicas e sexualidade, mas mesmo assim alguns alunos
me implicavam. Nunca entendi porque Denny não era implicado afinal ele era tão
gay quanto eu, mas ao contrário de mim ele nunca foi implicado ou chamado de
‘viado’ ou empurrado escada tendo que levar quatro pontos na cabeça. No último
ano do colegial eu tinha dezessete anos e era um dos mais novos a se formar
porque a maioria já tinha dezoito Aos, mas como eu só fazia aniversário no fim
do ano eu era um dos poucos a ter dezessete anos.
Não é fácil ser adolescente no
colegial. Tínhamos tantas coisas ao nosso redor e éramos tão inocentes apesar
de nos achar os donos do mundo: Líderes de torcida, provas finais, festas,
status, traficantes, pornografia, hormônios a flor da pele, trabalho durante o
verão, narcóticos, “Molly”, Valium, gravidez na adolescência, mentiras,
traições, namoros, sexo, políticos, manchetes, rei e rainha do baile, DSTs,
tiroteios no colégio, sonhos, professores pedófilos, terapeutas, sedativos,
pressão das panelinhas, obsessão sexual, TOC, autoridades, a internet matando a
realidade… enfim. Dizem que ser adolescente é a melhor fase da vida, mas é na
adolescência que encontramos a maioria dos problemas, mas nenhuma solução. A
pressão que era colocada em nós naquela época era muita. A maioria das pessoas
já tinham sonhos e um futuro traçado, mas eu era um dos que não sabia o que
faria depois do colegial porque o meu maior sonho era sair vivo de lá. Só
queria que acabasse logo.
- não gosto de mentir para Roger –
falei para Gray parando de contar o que me lembrava daquela noite.
- eu sei que não gosta – falou Gray –
mas é preciso. Todos nós estamos aqui por você, todos mentimos por você Mike.
- eu posso ir a policia e contar…
- nem pense nisso – falou Sophie – não
se trata mais só de você. Todos estamos envolvidos nisso. Quando mais você
fala, mais eles desconfiam. Vai chegar em um momento em que você não vai
aguentar a pressão colocada em você.
- ela está certa – falou Gray – se você
quisesse ter contado você deveria ter feito isso na época. Vai ser pior pra
você se contar agora. Acredite em mim – falou Gray.
Depois que as duas horas se passaram eu
já tinha contado tudo o que me lembrava daquela noite e Denny e Sophie contaram
novamente para Gray do que eles se lembravam. Nick, meu professor de biologia
contou o que sabia e meu pai Larry também. Gray anotou todos os pontos de vista
daquela noite.
- era isso que eu precisava – falou
Gray. Eu só precisava refrescar minha mente caso algum de vocês precise.
- nós precisamos tomar cuidado? –
perguntou Denny – quer dizer… você acha que eles irão nos chamar para Depor?
- todos esses seis anos Mason foi dado
como morto afinal o corpo não foi encontrado, mas a família dele ainda tinha
esperanças de que estivesse vivo, mas agora que encontraram os restos mortais
dele a família não vai descansar até descobrir o que aconteceu. Vocês foram ao
Baile, certo? Todos que assinaram a lista do Baile serão chamados para depor
dependendo da proximidade que tinham com Mason.
- e é obvio que todo mundo se lembra
dele me implicando no colegial então se eles forem desconfiar de alguém eu
serei o primeiro suspeito porque tinha motivos de sobra para querer revidar –
falei – e como Denny e Sophie eram meus melhores amigos na época eles também
serão chamados.
- exato – falou Gray – a partir de
agora, voltem a viver a vida de vocês. Se a policia entrar em contato com
qualquer um de vocês é só me ligar. Não só eu, mas a Olympus Advocacy irá
defende-los. Um grupo de doze advogados. Então não se preocupem com isso. A
seis anos atrás eu disse que não deixaria nenhum de vocês serem pegos e a
promessa ainda está de pé. Não importa o que Mike viu naquela noite, ele não
pode dizer a policia.
- eu vou embora então – falei me
levantando.
- vou com você – falou Nick. Nós
podemos descer juntos, dessa forma não desconfiam de nós.
- vê se não fica paranoico – falou
Sophie me dando um abraço – não vou aguentar você paranoico como da outra vez.
- eu não vou ficar, prometo – falei
abraçando Denny também.
- foi bom ver você de novo Mike. Peter
sente sua falta ás vezes.
- diga um olá para ele, ou, espere… ele
não sabe que você veio me ver, certo?
- exato – falou Denny rindo.
Larry se levantou e veio até mim me
dando um abraço e eu o abracei mesmo sem querer.
- me perdoa por ter roubado seu
dinheiro.
- você sabe o quanto esse dinheiro
significa para mim. Não pelo valor, mas de onde ele veio.
- você não vai me perdoar? Mesmo depois
do que eu fiz por você?
- se o senhor tivesse pedido eu tinha
te dado. Não precisava ter pedido duas vezes.
- você sabe que de todos eu fui o mais
afetado pelo o que aconteceu naquela noite. Eu tive pesadelos todos esses anos
e te culpei por muitas coisas que deu errado em minha vida e eu só queria te
machucar da forma que eu me sentia ferido. Eu virei um bêbado, te estuprei, te
deserdei como filho, te disse coisas horríveis que nenhum pai deve dizer ao
filho e mesmo assim todas as vezes você me perdoou. Você é forte Mike. Mais
forte do que eu, mais forte do que todos nós juntos. Eu tinha ódio de ver você
viver normalmente quando eu não conseguia esquecer o que fiz naquela noite.
- eu te entendo pai. Todas as coisas
que vocês fizeram para me proteger, eu agradeço muito e eu não posso ficar
bravo com vocês, nenhum de vocês – falei olhando para eles.
- você me perdoa por ter te roubado?
- sim, mas não perdoo Vanessa. Eu sei o
quanto o senhor é traumatizado pela aquela noite. E foi naquela noite fria de
vinte e cinco de abril de dois mil e dez que o senhor provou ser meu pai.
Foi naquela noite que provou me amar incondicionalmente. Naquela noite eu jurei
que não importasse o que o senhor fizesse comigo eu iria te amar
incondicionalmente e te perdoar todas as vezes porque o senhor me perdoou. Foi
difícil, não vou dizer que não doeu descobrir que você me roubou mais de um
milhão, mas agora com tudo voltando eu me lembro do que senti quando o senhor
me deu banho aquela noite. Me lembrei de como disse que me amava do mesmo jeito
e que faria de tudo para me proteger e que não me deixaria ir preso. Porque o
que aconteceu naquela noite estragaria a vida de todos nesse quarto de hotel.
- você me perdoa por ter te roubado um
milhão? – perguntou Larry.
- sim – falei respirando fundo – você
carregou um corpo por mim. você cumpriu o que prometeu – falei respirando fundo
– falei olhando no relógio – preciso ir.
- vamos indo – falou Nick saindo do
apartamento e eu fui com ele.
Nós atravessamos o corredor e entramos no
elevador.
- você cresceu – falou Nick.
- pois é – falei aparentemente nervoso.
- você está bem? Parece nervoso.
- você não ficaria? Agora eu começo a
pensar que talvez tivesse sido melhor ter ido a policia na época – falei saindo
do elevador assim que as portas se abriram.
Nick me acompanhou até a saída.
- não se preocupe com isso – falou Nick
– você não o matou – falou ele tentando me acalmar – Você não o matou Mike, mas
se não tivesse escondido o corpo você seria acusado de assassinato. Você seria
preso por algo que não fez e é por isso que eu ainda estou aqui e estou
disposto a te defender. Eu e todo mundo que viajou horas só pra te ver e fazer
sua parte. Eles não vão encontrar nada na floresta que te liguem ao
assassinato. Fique tranquilo.
- vou tentar – falei respirando fundo e
voltando para o carro do meu tio. quinze minutos depois eu estava no shopping
novamente. O meu único problema foi que não consegui estacionar na mesma vaga,
mas estacionei em um lugar próximo. Talvez ele não se lembrasse.
Ao chegar no terceiro andar eu fui
andado em direção ao cinema e foi quando Roger olhou pra mim. ele estava lá
esperando que eu saísse do cinema.
- onde você estava? – perguntou Roger.
- a sessão já acabou.
- eu quero saber onde você estava
porque meu carro não está no estacionamento e você não assistiu ao filme porque
você não estava na sessão. Não minta pra mim Mike – falou Roger autoritário
exigindo uma resposta verdadeira.
Fiquei em silêncio por um tempo tentado
encontrar a mentira perfeita.
- tem a ver com o garoto Mason? Eu nem
sabia que você sabia dirigir.
- não. Eu fui ver Larry.
- você o que?
- eu fui ver Larry. Eu ouvi o que você
disse sobre ser difícil mandar seu irmão ir embora de casa porque você o ama
então eu descobri o hotel que ele estava e fui até lá dizer que eu o perdoo.
Não perdoo Vanessa e não aceito ela na minha casa, mas ele é meu pai e se ele
quiser vir até nós tudo bem. vou a policia dizer que eu dei o dinheiro – falei
mentindo. A policia não estava nem sabendo sobre o roubo do dinheiro.
- não precisava ter feito isso meu
amor.
- precisava sim Roger. É seu irmão e
meu pai.
Roger veio até mim e me deu um beijo.
- te amo tanto – falou Roger.
- te amo muito mais – falei abraçando
ele e deitando minha cabeça em seu ombro. Como disse antes, eu odiava mentir
para Roger e se fosse por mim eu contaria, mas têm mais cinco pessoas
envolvidas então é melhor ele não saber.
- me desculpa perguntar sobre Mason e
sobre o que você viu, eu sei que prometi não perguntar mais sobre isso, mas é
que quando vi que você não estava no cinema eu fiquei meio paranoico pensando
que talvez…
- tudo bem ficar paranoico – falei
alisando seu rosto – sinal de que você me ama. Você se preocupou e você é muito
fofo por ficar paranoico por mim.
- vamos fazer compras então?
- sim – falei segurando sua mão e
seguindo pelo corredor.
Roger olhava de um lado para o outro
procurando pelos produtos. Ele olhava em silêncio, em seguida olhava o valor e jogava
no carrinho de compras. Eu o seguida em silêncio sem dar opinião sobre o que
ele comprava ou deixava de comprar. Comecei a pensar no assunto que nós
devíamos conversar. Onde nós moraríamos? Na fazenda ou na cidade? Roger é um
rato da fazendo e eu um rato da cidade grande. Um de nós teria que abrir mão
para agradar o outro e isso é um assunto delicado porque mudança são sempre
estressantes para um casal. Estava pensando ainda em Mason e em como Gray
reuniu todo mundo para poder pegar depoimentos novamente. Sei que pareço o
suspeito número um e se alguém desconfiar de mim eu estou ferrado porque eu
posso não ter matado Mason, mas eu vi o que aconteceu e ajudei a esconder o
corpo.
Sou o tipo de homem que sempre gostou
de casa e de comprar coisas para casa. Roger comprava só o básico e eu
adicionava algumas coisas necessárias afinal Roger era um solteirão vivendo
sozinho á dois anos. Ele não parecia se importar muito com produtos higiênicos,
nem para casa e nem para ele.
- como foi o filme? – perguntou Roger.
- foi ótimo – falei colocando o cinto
de segurança. Não tinha odeia do que dizer a ele.
Antes que a conversa continuasse ouvi o
meu celular tocando. Peguei o celular no bolso da calça e vi que quem me ligava era Jerry. realmente
uma ligação dele eu não esperava receber tão cedo.
- alô? – falei sentado na cama.
- Mike?
- sou eu Jerry, como está?
- Estou ótimo. Porque está me ligando
tão tarde? Aconteceu alguma coisa?
- não, mas uma coisa está prestes á
acontecer.
- como assim?
- Mike, meu editor me deu uma matéria
hoje. Ele disse que eu devo publicá-la. Eu gosto muito de você Mike e te
considero apesar de não estarmos, mais juntos, mas se eu não publicar eu perco
o meu emprego. Eu só estou te ligando para que você saiba por mim do que pelos
jornais.
- é algo sobre mim? – falei sentindo um
calafrio na espinha; Será que eles tinham conseguido me ligar ao assassinato de
Mason?
- não – falou Jerry – é sobre Adam.
- sobre Adam? O que é?
- são duas coisas… – falou Jerry
hesitando.
- pode me dizer Jerry. É tão grave
assim?
- sabe a Rebecca?
- sim, o que tem ela?
- você sabia que ela é filha de Adam?
- o que? – falei surpreso – Rebecca é o
que?
- Essa não é a parte ruim Mike… - falou
Jerry.
- e qual é a parte ruim?
- á quatro anos atrás – falou Jerry
pausando – Adam foi preso e denunciado por agressão física.
- Quatro anos atrás? Agressão física?
Isso é grave, mas não tão grave assim.
- Ele foi acusado por agressão física e
a motivação foi homofobia.
- homofobia?
- Mike, Adam bateu em um homossexual
até quase matar.
- Adam fez o que?
- o nome do garoto é Anthony Sullivan.
Quando aconteceu esse episódio ele tinha dezenove anos – falou Jerry pausando –
sinto muito Mike, mas eu preciso publicar a história, Se eu não o fiz eu perco
o emprego e outra pessoa publica. Me perdoa por não poder fazer nada.
Nesse momento eu tirei o telefone de
celular da minha orelha e o coloquei no colo. Minha cabeça tinha muito
informação e milhares de pensamentos invadiram minha cabeça.
- Mike, você está bem? – perguntou Roger
ao meu lado dentro do carro – quem era?
Eu não respondi e apenas fiquei
pensando no que Jerry tinha me dito. Aquele Adam não é o Adam por quem eu me
apaixonei.
0 comentários:
Postar um comentário
Comente aqui o que você achou desse capítulo. Todos os comentários são lidos e respondidos. Um abração a todos ;)