III
Cruel Noite de Sexta
L
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anchonete Thirsty River. É o nome do lugar onde
tinha conseguido emprego. Estava gostando muito do meu trabalho. Admito que os
primeiros dias foram difíceis. Sentia muita dor no corpo quando chegava o fim
do dia afinal eu fazia de tudo um pouco. Ajudava na limpeza, organização da
cozinha, reposição das bebidas e no almoço de Julie eu que ficava no caixa. Algumas
semanas se passaram e tudo agora parece mais fácil. Já tinha entrado na rotina.
Julie e eu nunca nos demos bem. Ela não aceitou muito bem a brincadeira que eu
tinha feito no dia que consegui o emprego e desse modo ela apenas me tolerava.
Mya e eu por outro lado estávamos
nos dando muito bem. Eu fazia o jantar quase todos os dias e essa era a melhor
parte do meu dia. Poder sair do trabalho para cozinhar e durante o jantar poder
contar para Mya o que tinha acontecido no meu dia. Ela compartilhava bastante
sobre as provas, colegas e especialmente sobre o seu namoro com o tal Professor
Rudolph. O homem casado ao qual ela tinha um caso. Ela sempre ficava animada e
com o rosto corado sempre que eu perguntava sobre ele. Nós também tínhamos
pegado o hábito de assistirmos ‘Dança com as Estrelas’ toda semana. Tinha se
tornado nosso programa favorito e é obvio que cada um de nós torcia por um
casal diferente.
A cada fim de semana eu recebia o
meu salário e eu guardava metade dele em uma pequena caixa no meu guarda
roupas. Queria economizar para poder comprar algumas coisas para mim como uma
cama de verdade, móveis, algumas roupas novas e é claro poder sair a passeio.
Mya e eu ficávamos praticamente o tempo todo em casa. Às vezes eu passava as
noites de sábado assistindo TV sozinho porque Mya passava o fim de semana com
seu namorado. Estava feliz por ela estar se divertindo e por mais que ela
implorasse para sairmos juntos para que eu conhecesse alguém eu estava
relutando. Por mais que quisesse quando chegava o dia eu sempre desistia e
inventava uma desculpa. No momento não estava em meus planos conhecer alguém. Meus
planos consistiam apenas em provar para mim mesmo que eu era capaz de cuidar de
mim mesmo. O único prazer ao qual eu me permitia era cozinhar e Mya agradecia.
Era sexta de manhã e tanto Mya
quanto eu estávamos vestindo roupa. Nós tínhamos tomado banho e estávamos
pronto para sairmos. Mya para seu curso e eu para o Thirsty River. Apenas a
cortina nos separava.
- por favor, Stan! Vamos ao Pulse
Club – implorou Mya do outro lado.
- não Mya. Hoje é sexta e o
movimento vai ser muito, além do mais eu tenho turno amanhã. Julie pediu para
trocar comigo e como ela já tem motivos o suficiente para me odiar o jeito foi
trocar.
- deixa de bobeira. Nós não vamos
voltar tarde.
- eu não sei – Mya estava
tentando me convencer a sair com alguns dos amigos dela. Eles tinham combinado
que se todos fossem bem nas provas trimestrais eles iriam comemorar em uma
boate.
- vai ser legal. Eu prometo.
Vamos dançar, beber, nos divertir… por favor.
- eu não prometo nada.
- deixa de ser chato! – Mya abriu
a cortina me fazendo puxar o cobertor e cobrir meu corpo. Ela me assustou.
- eu estou pelado.
- por favor! Por favor… vamos? –
Mya sorriu e ficou lá parada.
- se eu disser que sim você
devolve minha privacidade?
- claro.
- Sim. Sim. Eu vou.
- isso! – falou ela batendo
palmas e soltando a cortina, mas ficando do meu lado – nós vamos sair ás nove.
- tudo bem agora devolve minha
privacidade – ainda usava a toalha para esconder meu corpo.
- tudo bem Sr. Puritano – Mya me
deixou em paz e eu pude vestir minha roupa para não chegar atrasado. Gostava de
chegar quinze minutos antes de começar o expediente. A última coisa que eu
queria era dar motivos para ser demitido.
O dia no trabalho foi como
qualquer outro. Bastante exaustivo, mas no fim do expediente eu sempre me
alegrava. Aquela sensação de dever cumprido. O relógio marcava quase sete da
noite. O meu expediente deveria ser das nove as cinco, mas como eu não era
registrado o Sr. Barker disse que me pagaria hora extra se eu trabalhasse das
oito as dezenove e eu topei. Julie por sua vez chegava ás onze da manhã e saia
ás sete junto comigo.
A lanchonete já havia fechado e
eu terminava de limpar o chão. Julie estava no caixa contanto os ganhos do dia
e foi quando o Sr. Barker se aproximou e olhou para o chão. Ele passou a mão em
uma das mesas e esfregou um dedo no outro.
- esse lugar nunca esteve tão
limpo – disse ele ajeitando os óculos no rosto – bom trabalho Echevarria.
- obrigado Sr. Barker – falei
forçando o sorriso. Olhei para Julie e ela contava o dinheiro, mas olhava pelo
canto do olho para mim. A expressão dela era de reprovação. Com certeza ela não
tinha gostado nada de eu ter recebido o elogio. Ou talvez eu só estivesse com
complexo de inferioridade achando que ela me odiava afinal apesar de não sermos
melhores amigos nós nos dávamos bem durante o expediente.
Quando terminei de limpar o chão
Julie ainda contava o dinheiro. Fui até o fundo da lanchonete até o meu armário,
retirei minhas luvas e depois que eu as higienizei as guardei. Estava pegando
minha mochila quando Julie apareceu.
- Stan será que você poderia me
fazer um favor?
- qual? – perguntei fechando meu
armário.
- será que você pode terminar de
contar o caixa? Eu estou atrasada. Tenho um encontro hoje à noite e já são
quase sete e meia.
- Okay – falei abrindo o armário
e jogando a mochila lá dentro de novo.
- obrigada – falou ela rindo
enquanto tirava seu avental.
Fui até o caixa e as luzes
estavam apagadas, só a luz da parte de trás iluminava o balcão. Não demorei
para terminar. Depois de uns vinte minutos coloquei tudo dentro da bolsa e
coloquei dentro do cofre que ficava escondido em uma falsa caixa de e eletricidade
ao lado do extintor. Apaguei a luz do caixa e voltei até o armário. Peguei
minha mochila, tranquei meu armário e guardei a chave. Antes de sair queria
tirar água do joelho, mas o Sr. Barker estava dentro do banheiro então acabei desistindo.
Já tinha me atrasado demais para chegar em casa. Teria que aguentar até chegar
em casa.
Sai pela porta dos fundos e segui
pela calçada até chegar ao ponto de ônibus. Era pouco mais depois das oito
horas quando desci no ponto e fui caminhando pela calçada desanimado. Não
estava com ânimo para sair. Estava tão cansado. Maldita a hora que aceitei sair
com Mya.
Ao entrar no apartamento vi que
estava tocando uma música animada. Ouvia o barulho de secador de cabelo e foi
quando vi que Mya não estava sozinha. Ela estava sentada em uma cadeira
enquanto outra mulher negra de cabelos castanhos escuros longos até abaixo no
ombro fazia algo em seu cabelo. Ela estava arrumada então devo deduzir que ela também
fazia parte do grupo de amigos de Mya que iria a tal boate.
- boa noite – falei meio sem
jeito jogando minha mochila em cima da mesa de centro. A garota negra sorriu
para mim. Seus olhos também sorriram.
- onde você estava? – falou Mya
se levantando com metade do cabelo em cachos enquanto a outra metade estava
molhada e lisa.
- tive que ficar até mais tarde
fechando o caixa.
- não importa, o que importa é
que você chegou – falou ela pegando na minha mão me puxando – Stan essa daqui é
minha melhor amiga Quinn. Quinn esse daqui é o meu melhor amigo, Stan.
- oi – falou Quinn me olhando de
cima em baixo.
- não liga – falou Mya voltando a
se sentar – ela é assim mesmo.
- droga – falou Quinn rindo –
desculpa – ela começou a rir – não liga é que faz tempo que não conheço ninguém
interessante.
- sem problema. Também faz um tempo
para mim – falei com as mãos para trás olhando de um lado para o outro.
- não precisa esconder as mãos –
Quinn voltou a fazer escova no cabelo de Quinn. Toda vez que ela pegava uma
mecha para trabalhar ela terminava em cachos – Mya me contou tudo sobre você.
Eu estou te olhando porque você é bonito. Você é gay, mas eu não sou cega.
- sem problema – falei relaxando
as mãos – enfim… acho que vou tomar meu banho então.
- eu já escolhi as roupas que
você vai usar.
- escolheu?
- sim. Está em cima da sua cama.
Espero que não se importe por eu ter mexido nas suas coisas.
Fui até a cama e vi uma camiseta
branca grande. Uma calça jeans cinza com buracos na perna. Só depois de um
tempo eu percebi que era a minha calça. Uma das duas únicas que eu tinha. Mya tinha
feito um buraco em cada perna e desfiado.
- o que você fez na minha calça?
- eu melhorei – falou ela – suas
roupas eram muito cafonas.
- mas você a rasgou.
- ela transformou sua calça em
uma destroyed – falou Quinn
- e esses sapatos? – havia um par
de sapatos meio estranhos. Sapatos pretos com cadarço, mas não eram sapatos
sociais. Só que também não eram tênis.
- eles vão combinar com a camisa
– Mya apontou para a camisa que estava dobrava em cima do braço do sofá. Quando
eu a abri vi que era uma camisa longa.
- mas essa camisa parece um
vestido! – era uma camisa branca com uma faixa vermelha no meio escrito ‘Sem
Grilo’.
- não é vestido. Se chama ‘abaulada’.
- não sei se essas roupas são
meus estilos.
- o que você sabe sobre estilo? –
falou Mya me repreendendo – você mesmo me disse que nunca saiu ou teve amigos.
Quinn e eu saímos sempre. Vai por mim.
- você tem razão – falei tentando
engolir aquelas roupas.
- vai por mim. Sei o que estou
fazendo.
- OK – respirei fundo tentando
processar tudo aquilo.
Deixei Mya e Quinn para trás,
peguei minhas roupas e fui para o banheiro. Não queria me vestir fora do
banheiro porque tinha certeza de que elas iam ficar me olhando só pra me encher
o saco e opinar sobre meu corpo e jeitos melhores de vestir a roupa. Não estava
afim de ser uma experiência do esquadrão de moda fajuto de Orlando.
Depois de tomar banho, vesti
minha roupa e sair do banheiro levando um susto. Quinn e Mya bateram palma.
Elas já estavam prontas para sair.
- finalmente a majestade resolveu
sair do banheiro? – falou Mya rindo.
- eu não demorei tanto assim.
- demorou sim – Quinn disse isso
rindo – e valeu a pena. Você está gato.
- estou nada – me virei para o
enorme espelho que tinha na sala e quase não reconheci a pessoa que vi no
reflexo. Estava diferente. Aquele com certeza não era meu estilo, mas talvez
nem soubesse qual era meu estilo. Meus cabelos estavam bem penteados para o
lado. Mya se aproximou por trás e deslizou os dedos e desajeitou.
- assim fica melhor.
- vamos? – Quinn pegou sua bolsa
e seu celular.
- vamos – fui até o sofá e peguei
a luva, mas antes que pudesse coloca-las Mya as arrancou de mim.
- você não vai usar isso – Mya
escondeu a luva atrás de si.
- não vou sair sem ela.
- claro que vai.
- me sinto nu sem ela – olhei
para minha mão e movimentei os dedos. As pessoas vão ficar me olhando, me
encarando. Elas ficam sem jeito quando veem minhas mãos.
- será mesmo? – Mya disse isso
apertando os lábios e cerrando os olhos – será que são as pessoas que ficam sem
jeito ou é você que tem vergonha da sua mão?
- eu não tenho vergonha.
- então por que esconde?
- já disse. Não gosto de chamar a
atenção.
- você tem um complexo de palhaço.
- complexo de palhaço? –
perguntei surpreso.
- você acha que chama a atenção
por causa da sua mão, que as pessoas estão rindo de você, mas talvez seja por
outro motivo. Já parou pra pensar nisso?
- e que motivo seria? Eu sou um
‘palhaço’ – mostrei as duas mãos – sabia que no passado pessoas como eu
trabalhavam em show de aberrações? O meu avô por parte de pai também tinha
Ectrodactilia e ele trabalhava em um circo. Em um show de aberrações.
- você disse certo. ‘Naquela
época’. Hoje é uma época diferente. Todo mundo é diferente em algo. Na verdade
é isso que nos destaca das outras pessoas. Em um mundo de cópias sem graça
todos querem ser diferente e você é. Devia celebrar isso e não esconder só pra
ser uma outra cópia chata de todo mundo.
Não conseguia ver o mundo como
Mya. Era fácil para ela falar. Ela tinha dez dedos. Quinn percebeu que Mya
estava gerando uma situação que estava saindo do controle e decidiu interferir.
- Entrega as luvas para ele.
Deixe-o usar – Quinn falou olhando para mim e depois para Mya.
- vou me sentir melhor com a luva
– minhas mãos estavam suando. Já estava nervoso por sair. Nunca tinha saído a
noite antes.
- então coloca as duas – disse
Mya pegando a outra que estava na gaveta – se você usar só uma as pessoas vão
reparar mais em você.
- obrigado – falei olhando para
Quinn enquanto colocava as duas luvas.
Pegamos um Uber para ir até a
boate Pulse. O relógio já marcava quase dez da noite quando saímos de casa. À
uma hora dessas já estaria dormindo porque teria que trabalhar cedo, mas não
queria estragar a noite de Mya. Nunca tinha sido convidado antes para sair e
não queria dizer ‘não’ quando acontecesse a primeira vez.
Quando chegamos vi que havia um
grande tridente vermelho na entrada da boate. O lugar era vermelho e havia
luzes azuis iluminando o prédio que era cinza. No alto em luzes brancas estava escrito
‘Pulse’. Havia uma fila para entrar e vários carros parados do lado de fora.
Depois de pagar a corrida nós
caminhamos em direção à entrada. Já se podia ouvir a música tocando lá de fora.
Era um lugar enorme. Havia dois refletores apontando para o céu. Pessoas
conversavam na fila esperando sua vez de entrar.
- nós vamos ter que ficar nessa
fila enorme? – perguntei desanimado. Sair de casa há essa hora pra ficar de pé
em uma fila por horas.
- não – disse Quinn – eu coloquei
os nossos nomes da lista.
- ela conhece um barman que
trabalha aqui – falou Mya. Ela usava um vestido curto e rodado. A parte de cima
era preta com renda e a parte da saia era vermelha. Ela usava saltos de cor
preta. Os cabelos cacheados voavam com a
brisa. Quinn por outro lado usava um vestido bem colado na cor branca com
detalhes em prateado. Um salto prateado e os cabelos lisos, mas ondulados na
ponta. Usava umas joias na cor prata e carregava consigo uma pequena bolsa
também branca.
Nós caminhamos na direção da
entrada e fui ficando com uma sensação estranha. Era como se eu fosse
encolhendo e a boate fosse ficando cada vez maior. Senti uma aflição e respirei
com os pulmões tentando aliviar aquele nervosismo.
- o fim da fila é daquele lado –
falou um dos seguranças com uma prancheta na mão.
- nosso nome está na lista –
Falou Quinn se aproximando do homem para que ele ouvisse melhor. Estava muito
barulhento. Mya e eu ficamos alguns passos para trás.
- quais os nomes? – perguntou o
homem negro de óculos escuros.
- Quinn Patrick Thomas, Miyako Sachiko Chen e Stanley Illtyd Anthony.
Aquilo me deixou surpreso. Como
Quinn sabia que meu sobrenome verdadeiro era Anthony e não Echevarria. Olhei
para Mya e ela olhou de volta. Percebi que ela tinha algo a ver com isso.
- porque você me disse que seu
nome é Echevarria? – disse Mya percebendo a minha reação ao ouvir meu
verdadeiro nome.
- acho que a pergunta aqui é: Como
você sabe meu sobrenome verdadeiro?
- quando você estava tomando
banho há alguns dias eu precisava passar seu nome para Quinn colocar na lista e
eu fui até suas coisas e encontrei sua identidade.
- é que eu não quero que minha
família me encontre. Achei que se mentisse o sobrenome em todos os lugares
seria mais difícil me encontrarem.
- não esquenta com isso – falou
Mya com um sorriso. Seus lábios com batom cor de rosa claro desenhou seu belo
sorriso – eu te entendo.
- Ok! Podem entrar – falou o
segurança abrindo caminho. Nós entramos pela porta e chegamos a um corredor
iluminado com várias cores diferentes. Havia estátuas sem cabeça, sem braços
por esse corredor. No fim do corredor havia duas mulheres usando máscaras
brancas. Elas usavam roupas pretas. Elas colocaram pulseiras em nossos braços.
Aso ver a minha mão uma das mulheres deu um sorriso.
- seja bem vindo – disse ela.
- obrigado – olhei em volta e a
mulher apontou para a esquerda e nós continuamos a andar.
- você já veio nesse lugar?
- algumas vezes – disse Quinn –
posso dizer com toda a certeza de que é o melhor lugar.
- estou ansiosa. Faz tempo que
não venho aqui – Mya disse isso segurando em minha mão – adoro a decoração. Me
sinto em um quadro do Salvatore Dali.
- eu adoro os quadros dele – falei
respirando fundo enquanto entravamos no lugar uma pequena fila. Eles estavam
revistando as pessoas antes de entrarem. Depois de sermos revistados nós
entramos por uma grande porta. A música ficava cada vez mais alta.
- você vai adorar esse lugar –
falou Quinn empurrando a porta.
Ouvi uma gritaria e as luzes
piscavam. A decoração era bem peculiar. Havia estátuas e obras de arte
espalhadas pelo lugar. As pessoas pulavam e dançavam ao som de alguma música
alta ao qual eu não identifiquei.
Havia um palco e mulheres e
homens dançavam vestidos de forma sensual. Eles animavam a todos com a dança. Quinn
não brincou quando disse que o lugar era um dos melhores. Acreditei nela pela
quantidade de pessoas dentro do lugar e pela fila enorme do lado de fora. O
lugar era enorme e estava lotado. Do lado direito sob luzes e um telão que
piscava colorido havia três DJs. Os três usavam mascaras de palhaço. Eles se
moviam agitados e pareciam observar o lugar.
- já ouviu falar no Major Lazer?
– perguntou Mya.
- são eles? – perguntei surpreso.
- são sim.
- porque estão usando essas
máscaras de palhaço?
- deve ser por causa das
pegadinhas que estão acontecendo pelo país – Mya deu risada daquilo enquanto
Quinn a puxava pelo braço. Mya segurou no meu e também me puxou. Nós passávamos
pelas pessoas dançando e bebendo até que chegamos ao bar.
Havia três barmen e todos estavam
sem camisa e todos usavam calças com suspensórios. Um deles fazia truques com a
bebida. Malabarismo com a coqueteleira. Enquanto esperávamos nossa vez no meio
daquela multidão percebi que havia contorcionistas assoprando fogo e alguns fazendo
acrobacias lá no alto como no circo.
- Stan, esse daqui é Ryan – falou
Quinn me apresentando a um rapaz loiro de cabeça raspada e olhos azuis. Era um dos
caras do bar – Ryan esse daqui é o Stan. Ele mora com a Mya.
- prazer – falei apertando a mão
dele. Nem reparei muito nele e voltei a olhar em volta. O lugar parecia em
chamas. Havia muito barulho.
- beleza? – perguntou Ryan com um
meio sorriso voltando a olhar para Quinn – o que vocês vão querer beber?
- pra mim um Dry Martini – disse Quinn olhando para nós – e vocês?
- eu quero um Cocktail Brandy – falou Mya.
- pra mim pode ser um
refrigerante.
- nem pensar – falou Mya.
- preciso trabalhar amanhã.
- Ryan o que você recomenda para
um marinheiro de primeira viagem? – perguntou Quinn.
- você nunca bebeu? – perguntou
Ryan para mim.
- não. Nunca. É a primeira vez
que venho a um lugar como esse. –olhei em volta ainda achando aquilo tudo
estranho.
- acho que pra você vou preparar
um Café Irlandês – falou Ryan movendo as mãos e já pegando os ingredientes.
Café, chá, uísque, creme de leite e outras coisas. Ele começou a fazer sua
mágica e eu olhei em volta. Ao meu lado esquerdo ao longo havia alguém em uma
fantasia de palhaço segurando um balão olhando para mim. Seu rosto estava
virado e ele estava imóvel. Ele me encarava e mesmo de longe eu sabia que ele
olhava para mim.
Comecei a sentir um arrepio na
espinha. Ele não parava de olhar para mim. Aquela máscara com um sorriso e
expressão assustadora me encarando. Foi então que uma turma de amigos passou
por ele e esbarrou fazendo-o balançar. Era só a porcaria de uma estátua. Fazia
parte da decoração. Me senti um idiota.
- aqui está – falou Ryan chamando
minha atenção me entregando o drink – espero que goste.
- obrigado – falei entregando meu
cartão para ele registrar a bebida.
- não precisa. É por conta da
casa. Um brinque de boas vindas.
- obrigado – falei tomando um
gole. Era bem forte.
- gostou? – perguntou Ryan.
- adorei.
Antes que pudesse dizer qualquer
outra coisa Mya segurou na minha mão e me puxou.
- vou te apresentar a meus
amigos.
A bebida era bem forte e depois
de um Café Irlandês um Sex on the Beach
e um Daiquiri eu já me sentia um pouco alto. Não sei se os drinques que eram
fortes ou se era eu que não sabia beber e tomava tudo como se fosse água. Não
sei nem que horas eram porque no fim nem me importava mais. Sabia que
trabalharia de manhã, mas estava gostando de estar lá fora com todo mundo.
Sentindo-me normal. Em certo momento da noite eles chamaram pessoas para subir
ao palco para dançarem ao som de vários estilos de música. Os melhores
dançarinos ganharam prêmios.
- está gostando? – perguntou Mya
quando nos sentamos em um enorme divã cor de rosa para descansar.
- sim – falei respirando fundo
olhando em volta – obrigado por me convidar.
- obrigado por vir – falou Mya se
levantando – vamos dançar mais um pouco?
- Vou ao banheiro e já encontro
você lá.
- Okay – falou Mya indo.
Me levantei e passei pela
multidão procurando o banheiro. Quinn não mentiu. Havia um lugar com piscinas. Passei
bem longe. Depois de sai do banheiro decidi ir até o bar e pegar uma água.
Estava com sede. Ao chegar lá eu não vi Ryan, mas fui atendido por uma mulher
que logo me entregou uma garrafa com água gelada.
- obrigado – falei entregando o
cartão – o Ryan já foi embora? – perguntei curioso.
- conhece o Ryan? – perguntou a
mulher.
- sim. Ele é amigo de uma amiga.
- que nada. Ele está ali na pausa
dele – falou ela apontando. Ryan estava dançando com uma mulher. Os dois
estavam abraçados e ele falava algo no ouvido da mulher.
Ele e a mulher começaram a se
mover entre a multidão e eu pude ver o rosto da garota de cabelos longos e
castanhos. Olhos claros e um sorriso no rosto. Ela deu um selinho na boca de
Ryan e olhou para mim. Nós ficamos nos olhando por um tempo. Apenas nos
encarávamos.
- Stan? – falou a garota de
longe. Não consegui ouvir sua voz, mas li seus lábios. Ela deixou Ryan para
trás e veio andando rapidamente até mim e quando chegou ela me abraçou forte.
Eu a abracei de volta. Era Casey, minha irmã – o que está fazendo aqui? Minha
mãe e meu pai estão preocupados com você.
Me afastei de Casey e corri na
direção contrária. Vi que Casey me seguiu enquanto saia da boate. Passei pelos
mesmos corredores, pelas mesmas estátuas até que cheguei do lado de fora. Ainda
havia uma fila lá de fora. Estava gelado. Respirei fundo e tentei recuperar o
fôlego.
- Stan? O que está fazendo aqui?
– falou Casey me puxando pelo braço me fazendo olhar para ela. Nós ficamos em
silêncio. Em seguida vi Ryan sair e vir até nós.
- o que está acontecendo? –
perguntou Ryan para Casey olhando para mim.
- Ryan esse daqui é o Stan. Meu
irmão.
- o gêmeo? – perguntou Ryan.
- sim – respondeu ela engolindo
em seco – Stan esse daqui é meu namorado Ryan.
- Sim, eu o conheço. Ele é barman
- respirei fundo tentando assimilar.
- o que está fazendo aqui em
Orlando? – Casey parecia preocupada e curiosa – Mamãe e papai estão
preocupados. Eles até deram queixa na policia do seu desaparecimento. Casey
automaticamente olhou para minhas mãos e viu que eu estava de luva – está tudo
bem com você?
- eu estou bem – falei respirando
fundo.
- porque fugiu de casa?
- porque eu não aguentava mais a
pressão deles sobre meus ombros. Eu só queria ter a mesma chance que você teve.
Sair de casa e viver a vida.
Casey não disse nada e apenas me
abraçou. Pela primeira vez em muito tempo eu a abracei de volta. Sentindo seu
corpo quente junto ao meu. Me senti feliz por encontra-la.
- onde está Caylee? – perguntei
quando nos soltamos.
Caylee era minha sobrinha. Alguns
meses depois de ter se mudando para Orlando Casey acabou engravidando. Por mais
que ela não fosse casada e Caylee tivesse sido um acidente ela acabou sendo uma
benção para todos. Papai e mamãe mãe receberam Caylee como um presente em suas
vidas. Ela era fofa. Cabelos castanhos, olhos azuis e aquela expressão de
garota levada. A última vez que eu a vi foi no natal quando Casey passou
algumas semanas conosco. Gostava da ideia de ser tio. Não pensava me ter
filhos. Não me arriscaria a dar as minhas mãos para ele.
- em casa com a babá – falou
Casey – ela vai ficar feliz em te ver. Ela vive falando sobre o tio Stan –
falou Casey segurando um sorriso.
- também estou com saudades dela.
- nossos pais vão ficar feliz em
saber que você está bem.
- você não pode contar para eles
– falei me afastando dela dando dois passos para trás – eles vão me obrigar a
voltar e a fazer a cirurgia.
- você não quer fazer?
- não. Eu não quero – falei me
sentindo mal, mas feliz por finalmente dizer em voz alta – não quero passar por
isso. Não de novo. Não aguento mais viver por essas mãos – falei tirando as
luvas. Ryan pareceu surpreso ao ver minha mão deformada – minha vida é mais do
que essas mãos. Eu tenho uma vida e uma mão com cinco dedos ou três não vai
mudar isso.
- porque você não disse isso a
eles?
- porque Nick ficaria
decepcionado – falei me sentando na calçada – você sabe que ele fez medicina e
se tornou cirurgião plástico para poder fazer essa cirurgia. Ele fez de tudo
por mim e eu não quero decepcioná-lo.
Casey se sentou ao meu lado e
Ryan se sentou ao lado de Casey. Casey pegou minha mão e entrelaçou seus dedos
nos meus.
- tudo bem – falou Casey – eu não
conto se você não quiser.
- por favor. Faça isso por mim.
- OK – falou Casey me abraçando e
eu a abracei de volta – vamos voltar lá pra dentro?
- não – falei me levantando e os
dois se levantaram também – acho que vou embora. Já é tarde e eu tenho que
trabalhar de manhã.
- conseguiu um trabalho? –
perguntou ela com um sorriso.
- sim. Em uma lanchonete – falei
forçando um sorriso – e você?
- continuo na mesma – disse Casey
com um sorriso ainda trabalho no Parque da Universal Estúdio.
- que bom – respirei fundo e
peguei meu celular.
- desculpa por não ter ido
comemorar o nosso aniversário – falou Casey – fiquei sabendo que fizeram dois
bolos.
- sim. Fizeram. Um com o meu nome
e um com o seu.
- eu queria ter ido, mas você
sabe… - Casey deu uma pausa – Você sabe que não me dou muito bem com o papai.
- não… eu sei. Eu te entendo.
- me dê o seu número de telefone
– falou Casey com um sorriso.
- claro.
Depois que trocamos o número de telefone me
despedi de Casey e Ryan e pedi que ele avisasse Quinn e Mya que eu tinha ido
embora. Pedi desculpas por ter ido sem me despedir delas. Cheguei em casa por
volta das três da manhã, tomei um banho e me deitei. Por mais que fosse tarde
demorei para dormir. Ainda estava com aquela sensação de euforia por ter
encontrado minha irmã. Se dependesse de mim eu nunca teria procurado por ela.
Nós nos distanciamos nos últimos
anos, mas nós tínhamos uma ligação. Sinto que faríamos qualquer coisa um pelo
outro. Era estranho. Algo que não conseguia explicar. Me sentia ligado a ela de
alguma forma e tê-la encontrado naquela me fez perceber que aquilo era real.
Aquela vida era real. A nova cidade, o emprego, a noite com os amigos…
finalmente tinha as rédeas da minha própria vida. Tudo o que precisava agora
era conseguir dormir porque teria que me levantar em algumas horas.
PERSONAGENS
WATTPAD
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